SOBRE HOMENS E MULHERES
Não precisamos fazer muito esforço para percebermos que os nossos problemas não significam nada para ninguém. A vida é um turbilhão de acontecimentos e nem sempre estamos preparados para nos comportarmos como se fôssemos peças de Lego. Sabe aqueles bloquinhos de plástico, que juntos, formam o que desejamos? Pois é... É nisso que a maioria das pessoas se transforma. Vão morrendo e se conformando com o que não são. Os sonhos vão ficando para trás. As contas se amontoando no escaninho. O amor vira uma miragem. A felicidade se esvanece e nos acostumamos a viver como perdedores. Passamos a existir mais para os outros do que para nós mesmos. E acabamos nos culpando por tudo que não deu certo. Aí entra o cigarro, a bebida, a droga, a depressão, a bulimia, a anorexia, a solidão, a síndrome do pânico, o materialismo e a falta de fé. Aí entra a dor de cabeça, a insônia, a falta de apetite, o excesso de fome, o egoísmo, a vaidade, a inveja, o orgulho, o consumismo, a avareza, a perda da libido, o vício... E a banca rota está armada. Daí por diante é o ser humano ladeira à baixo.
Alguns poucos felizardos percebem que viver não é isso. Percebem que se há sol lá fora – há também esperança aqui dentro. Percebem que não importa se chove ou faz sol. Porque é natural haver dias ensolarados e dias chuvosos na vida. Mas nada os impede que sejam nossos.
Minha família parece saída de um filme de terror em preto e branco. Ainda hoje, do alto dos meus dezoito anos, lembro-me de coisas tão aterrorizantes vividas naquela casa, que fariam qualquer um enforcar-se num pé-de-couve. Mesmo quando eu mau havia saído das fraldas, já entendia que mamãe sentia-se o tempo todo culpada. Ela agia todo o tempo como se tivesse com um homem morto no fundo da bolsa. Tratava-me como um bibelô, até mesmo quando me pegava na cama com alguém. Sentia-se mais culpada ainda, quando lembrava-se que havia nascido quarenta e cinco anos antes de mim. Sentia-se assim, porque sabia que estaria velha demais quando eu tivesse o meu primeiro orgasmo.
Mamãe tinha medo de tudo. Deve ser por isso que papai a tratava tão mau. Para ele, o respeito pela alma feminina era relativo. E o desrespeito, constante. Mulher para ele era como aquele rolo de papel que fica perto da privada. Por isso, mulher, ele usava e jogava fora. E mamãe era um prato cheio... Ele brincava com a insegurança dela como quem brinca de empurrar o outro no abismo. Mamãe caía sempre esborrachada no chão. Foi aí que percebi que mamãe era a mulher mais infeliz do mundo. Ela ficava o dia inteiro com o esfregão, o espanador, a vassoura e o pano de chão, limpando tudo que via pela frente – como se assim, pudesse limpar a própria alma.
Mamãe tinha medo de gente. Por isso se comportava como um espantalho, espulsando a nós, os corvos, para longe da plantação. O negócio dela era falar com os objetos, com as plantas, com as paredes, com o falso Chippendale que fora da vovó, com o faqueiro de prata chinês que furtara do enxoval da vizinha, com a geladeira Servel que papai trouxera dos Estados Unidos, com pregos, pulgas e carrapatos alheios. Mamãe era o enígma que habitava a nossa casa. Nunca se sabia o que ela estava fazendo. Aliás, era impossível saber em que lugar da casa ela estava. Às vezes sumia por tanto tempo, que achávamos que só iríamos encontrá-la numa outra vida. Desaparecia e reaparecia como um passe de mágica, sempre com seu avental do aparelho Wedgwood sujo de terra. Nos meus piores pesadelos, ela era um serial killer de musical da Broadway, enterrando suas vítimas no quintal dos outros.
Quando mamãe limpava a casa, tinha sempre umas panelas esperando por ela na cozinha. Todas as comidas queimavam, porque embora cozinhasse muito bem, nunca estava onde deveria estar. Sempre se perdia no tempo das coisas. Aliás, ela sabia tudo sobre o tempo, mas o tempo não sabia nada sobre ela.
As empregadas que trabalhavam para mamãe, ou se matavam ou ficavam loucas. Lembro-me de duas ou três, sendo levadas para fora da casa, amarradas à uma camisa-de-força, amparadas por enfermeiros mau encarados. Enquanto as coitadinhas eram arrastadas para dentro da ambulância como sacos-de-batata, mamãe corria para o quarto de empregada, disposta a provar que tinham roubado alguma coisa da casa. Ficava horas trancada naquele cubículo, tomando champagne, rindo, fumando uns cigarros esquisitos, de cheiro mais esquisito ainda, assistindo filme pornô, enquanto tramava seus joguinhos de caça aos ratos. Era assim que se referia àqueles que tinham pouco dinheiro: chamava-os de ratos. Ela maquiava a suposta cena do crime, para que elas parecessem culpadas, mas tenho certeza que nunca roubaram nada. Na verdade, lembro-me como se fosse hoje, que era ela quem passava a mão nas coisas das empregadas. Mamãe adorava fazer a limpa na carteira das moças, rasgar suas roupas, usar suas calcinhas, e colocar alguma jóia valiosa entre as coisas delas – só para ter o gostinho de vê-las sendo presas, caso recebessem alta do hospício. E como boa patroa que dizia ser, sempre as visitava religiosamente aos domingos depois da missa – seja no sanatório municipal, seja na casa de detenção feminina. Nesse jogo, mamãe ganhava sempre.
Quando se cansava de bancar a boazinha, seu passatempo predileto era falar mau dos homens. Lembro-me de mamãe escondendo o olho roxo atrás de uma garrafa de uísque e chorando as pitangas comigo: As mulheres sofrem muito por causa dos homens – dizia. Quando você crescer, minha filha, seja lésbica!
Papai deve ser aquele tipo de homem que manda muito mau na cama. Mamãe parecia mau amada, mau comida, mau fudida e mau paga. E com as minhas tias não era diferente... Parecia que os meus tios sempre deixavam a desejar na cama. Por isso ficavam sempre com aquela cara de quem comeu e não gostou. Certamente nunca tiveram um orgasmo. Certamente fingiam mais na cama do que fora dela. Certamente nem sequer se masturbavam. Comportavam-se como falsas virgens, que não queriam admitir que perderam o cabacinho. E eu, a ovelha negra da família, aprendendo a ser mentirosa com essas cobras criadas. Por causa delas, sempre tive medo dos homens. Só em pensar que poderia me casar com um homem que não me respeitasse, não me desse prazer na cama, e me comesse como se eu fosse um pote de picles em conserva, me contorcia toda. As amigas da mamãe também não me davam muitas eperanças... Viviam reclamando dos maridos, dos filhos, da conta de luz, da menstruação atrasada, da aversão ao sexo anal, de detestarem sexo oral, e toda aquela chatisse que eu era obrigada a ouvir. Para elas, os homens eram um mau necessário, onde os fins sempre justificam os meios. Era tudo de uma pobreza de espírito tão grande, que na minha testa parecia surgir um letreiro luminoso, que dizia: Men go out!
Com o tempo o mau estar passou. Conheci uns caras ótimos, que me ensinaram umas coisinhas apimentadas, difíceis de explicar sem ficar ruborizada, porque me deixam com os faróis acesos. O cara que mandava pior na cama – conhecia o Kama Sutra na ponta da língua e o corpo feminino de trás para frente. Nao era eu, que havia aprendido com eles a gozar, até mesmo quando tomava um copo d’ água, que ia ficar reclamando. Não sei porque as mulherem falam tão mau dos homens... Eles são ótimos!
Hoje estou casada e compreendo que nem sempre é facil ser feliz no casamento. Todavia aprendi duas lições que vou levar comigo até o infinito de mim mesma: Ninguém muda ninguém – é a primeira. As mulheres se apaixonam e acham que vão mudar os homens. É como se dissessem:
”A partir de hoje vocês não vão mais ao futebol, esqueçam o Maracanã, as peladas no fim de semana, o chopinho com os amigos depois do trabalho. Esqueçam as popozudas porque elas são todas um bando de vadias! De hoje em diante, somos só você e eu, querido. Temos a eternidade do mundo para discutirmos a nossa relação!”. Socorro!
As mulheres tratam os homens, como se eles fossem um bando de meninos, vivendo debaixo da saia das mães. Depois reclamam que os maridos são o que são: infiéis, arrogantes, depravados, machistas, impotentes, mau-educados, convencidos, mentirosos, infantis, ejaculadores precose, descarados, cínicos, manipuladores, inseguros. E quem não seria se fosse casado com uma chata dessas?! E tem mais... As mulheres namoram e acham que depois de casadas vão transformar sapos em príncipes. Ledo engano! Sapos serão sempre sapos. E príncipes poderão um dia vir a ser reis. Quanta diferença! Arrumou um batráquio, querida?! Então agora, engole o sapo!
A segunda lição é a que diz que o casal tem que aprender a ceder. O relacionamento a dois é o único jogo que ninguém quer sair perdendo. Por isso tantos casais se separam. Quem só pensa em ganhar, acaba perdendo. É a eterna lei da física dando as caras na vida da gente. É como se fosse o universo dando um empurrão na inércia, só para ver se a gente se mexe, cai no chão, reage ou se arrebenta. Donde se conclui, que no jogo do amor não pode existir vencedor ou vencido, porque se algo assim acontece, todos perdem. Amor é algo que se constrói diariamente. E quando a gente tem olhos para ver e ouvidos para ouvir – a felicidade acontece.
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Homens e mulheres são mesmo o maior barato! Nesse conto vc consegue passar essa emoção. Você deveria escrever uma peça falando sobre esse tema. Talento, você tem de sobra! Que escritor precioso você é, menino. Very good!
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