PESSOAS INVISÍVEIS
Todos precisam de um pouco de carinho, mas se esquecem de manter o espírito aberto, enveredando por lendas urbanas, imbuídos por um marketing pessoal dilacerador e antropofágico, que acelera uma baixa auto-estima. E perdem a visão de si mesmos e do outro — desviando o olhar. Passam a vida orando no Altar do Incenso, unindo retalhos e reverberando verbalizações. Levando o ego ao sacrifício, sendo um tanto Billie Holiday nas entranhas, a flor da pele talvez — mas sem a menor impudência.
¡Personas son como um rompecabezas muy grande! Llenas de misterios… ¡Y lo más invisible en la vida son ellas mismas!
Gêmeas siamesas que passam noites e dias a dividirem o mesmo corpo. E a vida continua... Um tempo em que você tem tudo, inclusive gente por perto. Dois segundos depois fica tolo e mudo, e se descobre no meio da web, vítima duma bala perdida — ou achada — com o sangue escorrendo do peito, e ninguém está lá para salvar a sua vida. Invisível? Fases da vida em que você está mais para Bispo do Rosário do que para Basquiat. E não perde a genialidade um só minuto, porque o encanto está em ser feliz sempre. Um alquimista contemplativo transformando vil metal em qualidade de vida. E isso vale ouro! Pessoas também amam e por isso odeiam tanto. Porque nem sempre são amadas. Às vezes você não se sente um pouco invisível? Eu também.
Andando nas Cidades Invisíveis do Ítalo Calvino, sabendo que o dia seguinte sempre é um dilema. E que as estrelas sempre mudam de posição, porque estão vivas. Um planeta naïf aonde muita gente se preocupa demais com o fim do mundo — e vive por osmose. Um oco existencial e nenhum motivo para brindar. É como se fosse fazer aniversário em plena guerra e descobrir que seus parentes e amigos estão mortos. E você ali — celebrando a sua própria vida. É como descobrir que o mundo é racista e você é negro. Invisível? Eu não acho!
Pessoas são como quadros na parede. Um Gauguin de ponta cabeça, dizendo:
“¿Cuándo, pues, compreenderán los hombres el sentido de la palabra liberdad?”. Códigos de barra tatuados com rena. Mártires e seus dias feriados. Pessoas são deuses em miniatura. Soldadinhos de chumbo do sortilégio, que arrumados lado a lado, formam o cenário que conhecemos como mundo, Terra, universo eqüidistante. Estórias com altas doses de acróstico, porque seus nomes são sonoros e são parlendas… “Karingana ua Karingana…” ”Once upon a time…” As pessoas são todas iguais, mas algumas personificam-se mais iguais do que as outras — e tornam-se invisíveis.
Pessoas são um nick name na internet, plugadas a uma placa pentium de última geração, moden 56 k V 90 on board, monitor de cristal líquido 29”, placa de vídeo 32 mb 3 D, disco rígido 18 Gb Ultra ATA, 32 Mb de memória, multimídia 52 X, placa de som 16 bits 3D, caixas de som amplificadas, floppy drive 1.44 Mb… “Baixando” suas músicas em MP3 e sons mid, indo e voltando ao chat, enviando programas, salvando imagens, falando com velhos amigos — que estão do outro lado do mundo — e que se conheceram na “rede” a algumas horas atrás… Amigos estes que talvez jamais se encontrem na real, mas que mesmo assim e por isso mesmo, são seus confidentes mais leais, com os quais, dividem seus segredos e sinergias, sonhos e orgasmos... E outros tantos que fazem sem cerimônia — sexo virtual. Orkut, teclado high-tech, câmeras de vídeo-conferência, ICQ, msn, e-mail, RealPlayer, iPod, PowerPoint, softwares, Acrobat Reader, Excel, Word, Outlook Express, Internet Explorer, download, BPS, FAQ, Upload, shareware, Netscape, WinAmp, download, DVD Rom, Web-art, WinZip, CorelDRAW, eSafe, Backups, Corel PHOTO-PAINT, Dreamwear, Flash, Photoshop, Fireworks, windows, linux, WebDesign… Máquinas digitais e relacionamentos a cabo, que são eternizados e gravados em CD Rom. Vidas em 3D girando a 360º… Pessoas dividindo as suas experiências na Torre de Babel do Terceiro Milênio. A vida virtual é real se estamos on-line!
Na World Wide Web, pode-se desde admirar as obras de Miró a Dali no Reina Sofia à comprar preservativos no mercado virtual. Ver as telas de Francisco de Goya y Lucientes e Diego Velázquez de Silva no Museo del Prado. E apaixonar-se por Maya Desnuda e Las Meninas, como se estivesse em plena Madrid, caminhando pela Plaza Mayor, indo a Plaza Del Toros, aprendendo uma receita de jamón com pollo ou saboreando chocolate com churros, enquanto observa-se a beleza da ponte de Segóvia — ouvindo o som flamenco de Sevilla. A vida dos internautas passa pelo scanner, pelo disquete, pela impressora... Tudo se transforma. Tudo se copia. E o que não for interessante — delete! — pessoas@pessoasinvisiveis.net: este é o nosso e-mail. O nosso site é gratuito. Os nossos operadores de suporte são melhores do que os outros, porque fazem o que gostam! E para acessar à Pessoas Invisíveis, conecte-se: www.pessoas.com.net.
Um dia de tertúlia com a Guernica — falando sobre Picasso. E os minutos passam cercados de rapazes que jogam balé clássico e moças que dançam futebol. Uns tantos que nem sabem o que são, e outros que são somente — e ao mesmo tempo — homens e mulheres. Almodóvar está aí e não me deixa mentir… Pessoas são um tanto Carne Trémula e seus sentimentos iguais a Feira Rastro. Um museu alternativo com cabeça, corpo e membros... Sentimentos são como trovadores debaixo da janela, compondo sonatas para Magdalena Carmen Frida Khalo y Calderón… Uma tuna a céu aberto tendo as estrelas dos homeless como teto. Uma orelha dada de presente a Van Gogh e um país “em que se plantando tudo dá”, inclusive desnutrição e fome. Um Aurélio como “Pai dos Cultos” e analfabetos digitais sem certidão de nascimento… Pais off-line sem carteira de identidade, que jamais aprenderão a ler à alma da gente. Pessoas são assim… E o planeta assado sob a camada de ozônio. El Niño, después La Niña… Aonde a humanidade vai parar?! Se cego é aquele que não quer ver, então com todo respeito aos deficientes visuais, somos realmente — Pessoas Invisíveis.
Quando nasceu o meu filho, Ordinateur, que veio a mim, como uma estrela cadente nas mãos de um anjo, foi o momento exato — em que voltei a ser criança.
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Sensacional, Betto! Sensacional!
ResponderExcluirOs seus textos sempre me emocionam, Betto. Muito talentoso, cara. Sucesso, leke!
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