BOULEVARD STRADIVARIUS 1718




A dez anos parei o carro na porta do Café de Fleur, e ainda hoje aqui estou, imaginando o que aquelas pessoas sentadas ali, têm, que eu não tenho. Tempo, eu sei que não é... Sou uma ótima companhia, mas às vezes ficar comigo mesmo é supérfluo. E hoje em particular, sinto-me insuportável. Acordei meio amargo, meio azedo, olhando Paris como se Paris não fosse. De luto, sinto falta dos amigos que perdi no Metrô de Londres... na cidade que vivi quando jovem e que não existe mais. Nem ela, nem meus amigos, nem nossa juventude... Terrorism – fuck off! I’m not afraid!

100% Humain Peigné. Laver à l’eau tiège, sans agent de blanchiment. Sécher à basse temp. Fabrique aux esprit.

O mundo anda tão machucado que às vezes sinto-me morando nos quadrinhos de Frank Miller, em Sin City, amando uma prostituta grávida no Old Town, no clima sexy, macabro, multiétnico, hilário, multiidiomático e violento, do filme co-dirigido por Roberto Rodriguez, – algemado por quase duas horas na fria poltrona de couro encardido do cinema, – no último canto do universo que alguém como eu desejaria evitar. Então, abaixo as pantalons e deixo com que façam com a boca o que eu só poderia fazer com as mãos. E saio do cinema como entrei, pela porta da frente, tremendo como a última folha de uma árvore que acabou de morrer – só que um pouco mais leve. Apesar do risco, valeu a pena... Gozei.
Pausa para ir ao cuvette:
Não me sinto tão triste assim desde o dia que salvei a vida de um pássaro, e ele morreu. Foi nesse dia que percebi o quanto dizer eu te amo é bom. A vida é tão frágil quanto um pássaro, e voa, sem ao menos dizer adeus. Desde então digo ‘eu te amo’ todos os dias, porque não sei até quando estarei aqui. Vol d’oiseau! E é sempre reconfortante para quem fica e para quem vai, saber que após bater asas, a vida continua a existir. E que o amor é tão eterno quanto um pássaro, enfim.

100% Humano Penteado. Lavar antes de usar, cores escuras “sangram”, lavar separadamente. Não usar água sanitária. Evitar amaciante em excesso. Secar imediatamente. Fabricado no espírito.

Músicas que pinto no carro enquanto ouço:
Hollaback Girl da Gwen Stefani, Lost Without Each Other do Hanson, Mockingbird do Eminem, Chonicles of Like and Death do Good Charlotte, President do Wyclef Jean, Make a Move do Incubus, He Wasn’t da Avril Lavigne, B.Y.O.B do System of a Down, O Amanhã do Detonautas Roque Clube, Best of you do FooFighters, Tamo aí na Atividade do Charlie Brown Jr, Anacrônico da Pitty, Elevation (Remix) do U2, Like a Stone do Audioslave, Procurando do Maskavo, Holiday do Green Day e You Gotta go do The Mighty Mighty Bosstones.

100% Combad Human. Wish warm, do not bleach, dry low. Made in spirit.

Estou em crise temática, produzindo telas, gastando tinta, pensando uma exposição subversiva, aonde eu mesmo sou o artista, o vídeo, a instalação, o curador, a inspiração comestível, a performance, o pincel e o quadro. Não sei o que pintar, por isso tinjo o linho em borrões desconexos, masturbando-me em seguida, misturando meu gozo à palheta de cores leitosas. A arte permite ao artista dizer coisas que a humanidade nem ousaria soletrar. Por isso, passo horas, dias, décadas – trancado no meu carro-atelier – pintando, soldando, esculpindo, e metamorfosiando-me em desenhos, textos, películas, criações... O silêncio é a oração dos sábios. Aqui em La Ville Lumière, fico tantos anos sem ser gente, que a cada seis meses, preciso me olhar no espelho para lembrar quem somos. E mesmo vivendo órfão de gente, étrange, sonho um dia retornar para fora de mim, emergir os olhos do umbigo, e voltar à plástica para Belas Artes superlativas. Mas por enquanto – afasto de mim esse cálice! Prefiro ficar assim, sozinho na insegurança do meu ateliê-carro-blindado, vendo os outros lá fora – como minhas cobaias humanas, ou como eles mesmos preferem ser chamados – Fonte de Inspiração. Ou, matéria-prima. Ou, design. Ou, como os sinto – árvores sem raiz. Outsiders!

Telas que ouço no carro enquanto pinto:
Reptilia do Strokes, Love don’t live here anymore (Remix) da Madonna, Política do Athaliba e a Firma, Layla do Oasis, Incomplete do BackstreetBoys, La Tortura da Shakira, Bem vindo ao clube do Dead Fish, A Maldição do Samba do Marcelo D2, Amar sin ser amada da Thalia, Izzo/In the end do Linkin Park & Jay Z, Girl do Destiny’s Child, Hold you Down da Jennifer Lopez Feat. Fat Joe, Renata do Tihuana, Points of Authority (Remix) do Linkin Park, Renata Maria do Chico Buarque e 21 th Century (Digital Boy) do Bad Religion.

Semana que vem exponho pela milionésima vez no Palais de Tokio. Minhas telas narcisistas adoram aquele lugar. E eu também. Ao sair daqui, levarei meu carro para passear no Musée de la Cité de la Musique, caminharemos por Montmartre depois, pisaremos em Sacré-Coeur, exporemos na Maison de L’Amerique Latine, declamaremos poesia na Librairiè Le Compitoir dês Mots, ganharemos o Festival Paris Cinema, teceremos arte comtemporânea na Foundation Cartier, viraremos baristas nas Galeries Lafayette, tomaremos vinho com cachaça no Bar des Theatres no Champs Elysées, voaremos com nossas bicicletas às margens do Sena, roubaremos roupas no Musée de la Mode et du Textile, e voltaremos nús para casa – porém vestidos. Procrastinação! Assim termina minha saga de hoje – no tempo de uma vida interna – buscando um tema para minha próxima empreitada artística, gozando em quadros, vendo gente nua do meu aquário de imagens poéticas, e na falta de cachorro, levando o carro para passear. Afinal meu carro é meu cão e meu cão-carro é muito gente. É isso! Minha próxima Obra será sobre carros, pássaros, cães, porra e gente. Finalmente! Paris, je t’aime.

Raul. “Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante, do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo”. Seixas.


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Comentários

  1. Betto Barquinn é tudo de bom! Você é meu escritor predileto, amigo! Sucesso!!!

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