TE AMO






O espelho quebrado no canto da sala e na penteadeira um porta-retrato aos pedaços. Um gosto de despedida na boca e a vassoura de ponta-cabeça, dizendo: Vá! Rá-ré-ri-ró... rua! Tchau. A escada carocol e um si bemol atravessando o samba. A perna bamba, a cadeira fora do lugar, o desejo de cócoras para o ar. A saudade catando poesia no vento, sorrisos espalhados em cima da cama, um alfinete espetado no dedo, presilhas de cabelo caídas no chão e um copo de conhaque de alcatrão. Um pregador, um parafuso, um percevejo. O celular toca, a roupa na corda amarrota, o leite derrama e a sopa queima. O arroz doce desandou. Não acertei o ponto do brigadeiro. Se você não correr agora no armazém, vai faltar açúcar para o doce do neném. Emprestei meus pensamentos e agora não sei o que fazer. Quer me ceder a sua mente? Não passa essa flanela suja no computador! Pode danificar o aparelho. Li numa revista que não é de bom-tom falar palavrão. Pára com isso ou lavo a sua boca com sabão! Quero vender a minha solidão por mil dólares. Quer comprar? Deixa essa sacola no chão e pega dois ovos no galinheiro. Você quer bolo de chocolate, mas não se mexe! Vá até a padaria e traga-me chocolate granulado, fermento, farinha de trigo, óleo de soja, essência de baunilha e margarina. Compra também uma vela de aniversário. Você gosta de cajuzinho? Que pergunta... Toda criança gosta de cajuzinho! Pensei em fazer cachorro-quente e fritar uns pasteizinhos de carne, o que você acha? Preciso de mostarda e ketchup. Aproveita e frita essas bolinhas de queijo para mim. Seus amigos gostam de quebra-queixo? Pensei em fazer um tabuleiro e deixar na mesinha de centro. Assim quem for passando, vai pegando. Ah, me faz um favor: Vai enchendo essas bolas de aniversário aqui para mim. Comprei azuis, porque é cor de menino. Sei que você gosta de verde, mas o pacote era mais caro. Nessa caixa tem língua de sogra, apito, chapeuzinho de papel e narizinho de palhaço. Arruma tudo na mesa para mim, depois leve o vira-lata para passear. Está bem... O vira-lata tem nome, eu sei: “Vladimir Maiakóvski”. Ter um filho de cinco anos metido à intelectual, ninguém merece. Anda logo menino! Leva logo esse cachorro na rua! E vê se não esquece de catar o cocôzinho dele. Não quero que os vizinhos digam que sou desmazelada. Joga também um balde de desinfetante onde ele fizer chichi. Temos que manter a cidade limpa. Não quero o meu nome em ‘boca de Matildes’. Quando voltar, assa essas pizzas para mim? Não demora! Se os garotos lhe chamarem para jogar bola, diga que hoje é seu aniversário e eu preciso de você em casa. Convida aquela velhinha que mora do outro lado da rua. Ela mora sozinha e eu não gosta que as pessoas fiquem sós. Liga para a sua avó e fala para ela trazer bala de coco. Estou cansanda, sabia? Vou tomar um banho de pétalas de rosas e já volto. Vigia o leite para não derramar no fogão. Quer bolo de puba? Enrola esses docinhos para mim? Thank you. Mamãe gosta muito de você, viu? Te amo.


    
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