PRA QUE DISCUTIR COM MADAME






Madame era uma pessoa difícil. Vivia me dando bronca por qualquer coisa. Se eu trazia o café, dizia que a visita tinha que ser servida pelo lado esquerdo. O que é claro, eu sempre errava. Quando varria a casa, dizia que eu escondia a sujeira debaixo do tapete. Passava o dedo nos móveis, e descobria nos cantinhos mais improváveis, aquele pó que ninguém via. Dizia que eu devia ler mais Dostoiévski. Insistia que uma pessoa que lê entende melhor o mundo a sua volta. Trazia-me uma dúzia de livros todos os dias: “Gente Pobre” foi o primeiro. Depois veio “O Duplo”, “Nétochka Nezvánova”, “O Sonho do Titio”, “A Vila de Stiepantchikov e seus habitantes”, “Humilhados e Ofendidos”, “Recordações da Casa dos Mortos”, “Memórias do Subsolo”, “Crime e Castigo”, “O Jogador”, “O Idiota”, “O Eterno Marido”, “Os Demônios”, “O Adolescente”,  e por último, “Os Irmãos Karamazov”. Passava à tarde perguntando-me se eu gostara dos livros. Eu respondia que sim. Depois sabatinava-me sobre cada romance, cada personagem, apegando-se aos mínimos detalhes, sem esquecer nenhum. Eu ficava horas sendo vítima de suas provas de literatura. À noite, só me deixava servir o jantar, se eu lhe dissesse o que era a “Teoria da Relatividade”. Perguntava-me quando Albert Einstein nasceu, quem foi Henri Poincaré, quem era Hendrik Lorentz, com quantos anos Isaac Newton morreu, terminando sempre com a célebre pergunta: “Qual é a fórmula que explica a relação entre massa e energia?”. Quando eu não sabia responder, ela me mandava ler “Olinto De Pretto”. Por insistência dela, passei da vassoura à faculdade, e hoje dou aula de filosofia em Harvard.









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