THRILLER

Semana passada, conversava com um psicólogo amigo meu, e ele me dizia que toda criança nasce com o desejo de ser feliz. “Às vezes o plano dá errado e a gente sofre” – completou. Fiquei pensando naquilo. Repassando a minha biografia, escarafunchando o escaninho da minha existência, percebo que de fato: nasci para ser feliz. É uma felicidade um tanto arbitrária,  compulsória, meio transgressora, de quem tem urgência moral de acertar. Devo ter sido um espírito tão errado no passado, que voltei portador de todas as multas divinas. Sendo assim, a minha missão seria: não errar. E não errar não só tem a ver com acertar, mas principalmente com fazê-lo bem. Acho que por isso que desde criança piso em ovos. Quando vou falar alguma coisa, inclusive quando me pego numa discussão, conto até dez e às vezes até cento e onze. Percebo que se abrisse a boca em determinado momento, e desse a resposta que meu velho espírito daria, erraria tanto, que ofenderia até o homem das cavernas. Seria como se a humanidade inteira, que viveu e morreu antes de mim, se revirasse coletivamente no túmulo, naquele exato momento. Algo quase ensaiado como a coreografia de “Thriller”, do Michael Jackson. Por isso, me calo. Pois de alguma forma, nasci com essa certeza de felicidade, que meu amigo psicólogo falou. E intuindo que meu espírito não é flor que se cheire, previ que se tomasse certas atitudes, mancharia ainda mais o meu nome perante Deus. E nessa caso, “Deus”, significa: “Aquele que me deu uma segunda chance”. Como nasci em busca da felicidade, teria que doar felicidade também. Aprendi desde cedo, que cada um só dá aquilo que tem. E mais do que isso: cada um só recebe aquilo que doa. Então, como eu queria ser muito feliz, me enchi de felicidade também. Saí doando a três por dois, fazendo o bem sem olhar a quem, ouvindo e falando coisas boas, que de fato, deixavam a mim e ao outro feliz. Acho que foi por aí que abafei a dor de ter sido infeliz.   

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