DESCALÇO NO PARQUE





Eu pisei numa pedrinha de riacho. Escorreguei no limo e furei o pé: como um barco que fura o casco. Caminhei assim mesmo, até o machucado da alma cicatrizar. Eu sou o tipo de pessoa que acredita no impossível. O amor é o primeiro e o último sentimento que tenho. O amor é sentimento definitivo em mim. Pois amar é minha forma de oração. Foi o amor que me trouxe o perdão. Foi o amor que me deu o que tenho. O amor me doou seu afeto. O amor fez de mim um caminho reto. Por isso entendo que toda forma de amar cabe no coração. Todo coração vale o amor que tem. Todavia o amor é um sentimento recente na minha vida. Antes eu achava que o amor era uma dessas armadilhas de pegar passarinho. Uma vez capturados pelo amor, uma vez feridos por estilingue ou por bodoque, éramos engaiolados como escravos: cortavam-nos as asas, tirávam-nos a autenticidade, e mandávam-nos para o avesso da vida. Passávamos a viver sem céu para voar. O nosso teto que era livre, agora era pintado de estrelas de plástico. Passávamos a viver na artificialidade. Passávamos a não mais existir. Para mim o amor era uma cilada. Uma piada mal contada. A liberdade na prisão. O amor para mim era uma cicatriz no rosto. Era aquilo que se esconde e ninguém vê. Entretanto o amor convenceu-me do contrário. O amor mostrou-me o seu diário. O amor contou-me os seus segredos. O amor se revelou. Por isso agora o amor é meu esteio: meu assolho. O amor é o chão que eu piso. O amor é minha folha solta no calendário.

Eu pisei numa pedrinha de riacho. Escorreguei no limo e furei o pé: como o barco que fura o casco. Como a vida: ladeira a baixo.


       
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