NÃO ENCONTRO QUEM ME QUEIRA

  

Ele gostava de colocar preço em tudo. Não enxergava o valor real das coisas. Vivia com uma máquina precificadora nas mãos, remarcando o mundo. Beijo, custa tanto. Abraço: Muito caro. Carinho: Pela hora da morte. Amor: Um absurdo! 'Às vezes o barato sai caro' – dizia. 'A vida é assim... Não dá desconto, não!'. O tempo passou e ele continuou a poupar até o que não tinha. Seus amigos afastaram-se. A mulher foi embora. Quando acabava de contar sua fortuna, lembrava-se dos filhos. Para pagar o tempo de sua ausência, deu a filha um carro. Ao filho deu uma moto. A ex mulher, – um apartamento em Miami. O tempo passou – eu já disse. E ele continuou a poupar até o que não tinha. Poupou perdão. Poupou poesia. Poupou caridade. Poupou fé. Poupou esperança. Poupou açúcar. Poupou afeto. Poupou tanto, que ficou cada vez mais endinheirado. De uma origem humilde, passou a homem mais rico do mundo. Seu nome virou sinônimo de poder. Sua presença virou antônimo de delicadeza. Os dias passaram somando-se a outros e quando se  deu conta já estava velho. Velho demais para voltar atrás. Não tinha amigos. Não tinha família. Mas tinha dinheiro. Muito  dinheiro. 'Posso comprar o mundo' – pensou. 'Todo mundo tem  seu preço'. 'É só encontrar alguém que eu possa comprar'. 'Olha aí freguesa! O amor madurinho!'. 'Moça bonita não paga, mas também não leva!'. 'Compra quem der o maior lance!'. 'As pessoas se vendem por qualquer trocado'. 'O ser humano a preço de banana!'. 'Pegue e pague'. 'Pagou! Levou!'. 'Não faltará quem me dê amor nos tempos de velhice' – completou. Ledo engano. O tempo passou e nada mudou. Ninguém se vendeu. Ele nada comprou.      

Um dia, caminhando pela rua, uma menina deu-lhe uma rosa. 'Quanto custa?' – perguntou. 'Não custa nada'. 'O amor não tem preço' – a menina respondeu.  

– O amor não tem preço? Não acredito!

Levou um susto, teve um enfarto e morreu.

® NÃO ENCONTRO QUEM ME QUEIRA ™ © by betto barquinn 2011
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