A ORDEM DAS ÁRVORES
Esperanza acabara de ler “Os Dois Cavalheiros de Verona”, de William Shakespeare, e ficara pensando em como a amizade é capaz de fazer milagres nos corações mais aflitos. A amizade de Valentim e Proteu, protagonistas desta história, é o tipo de laço que é capaz de unir duas pessoas para sempre. Os dois, amigos inseparáveis, viram a amizade posta a prova, por causa do interesse de ambos pela mesma mulher. Proteu amava Júlia, uma donzela de nobre espírito, mas apaixonou-se por Sílvia, filha do Duque de Milão, a mesma dama de sentimentos honestos, que seu amigo, Valentim, estava enamorado. Embora fosse um jovem de bom coração, Proteu entregou-se ao sentimento mesquinho de querer o que é dos outros. Sentimento este, que só alcança os corações puros, que um dia foram tocados pelo orgulho e pela vaidade. A sinceridade de sentimentos é tão grande para quem não vê maldade em nada, que deixa-se aniquilar pelo primeiro embuste que aparece. Assim aconteceu com Proteu. Por causa de um sentimento inverdadeiro, envergou-se ao chão como um galho seco. Traiu o próprio amigo, colocando-o numa emboscada horrorosa.
Sílvia era noiva do nobre Túrio, cuja união fazia muitíssimo gosto, o Duque de Milão. Mas como Sílvia não gostava de Túrio, resolvera fugir com Valentim para casarem-se longe dali. Valentim, julgando estar de posse da fidelidade de Proteu, confidencia ao amigo o plano de fuga. Proteu enciumado, procura o Duque de Milão, e conta-lhe que sua filha fugirá com Valentim para casar-se com ele. Irado pela dupla traição, o Duque de Milão interroga Valentim e confirma seu plano de fuga. O Duque expulsa Valentim da Corte de Milão, proibindo-o de caminhar por aquelas terras para sempre. Desolado, Valentim vai embora, mas teme voltar para Verona e viver uma vida de estranhamentos, longe de sua amada. Nesse meio tempo, Júlia vem de Verona e disfarçada de homem, hospeda-se numa estalagem, a fim de reencontrar-se com o amado Proteu. Acaba descobrindo que o cavalheiro que a deixara em Verona, agora estava apaixonado por outra: A bela Sílvia. Estristecida, mas decidida a reconquistar o amor de Proteu, Júlia descobre que o amado despedira um criado, e apresenta-se como seu novo pajem. Assim, perto do seu amor, poderia salvá-lo do sentimento que tomara a superfície de seu coração.
A história prossegue com uma série de acontecimentos: Proteu manda Júlia (que para ele é seu pajem Sebastião) visitar Sílvia, levando cartas de amor, presentes e um anel, o mesmo que Júlia lhe dera, quando este estava prestes a mudar-se para Milão. Júlia mesmo humilhada, aceita tudo tranquilamente, pois acredita que seu amado cairá em si, voltando a amá-la. Enquanto isso, Valentim é atacado por malfeitores, enquanto caminhava por uma floresta próxima ao palácio do Duque de Milão. Por sorte, os malfeitores procuravam um líder, e obrigaram Valentim a segui-los sob pena de morte, caso recusasse. Valentim aceita chefiar os malfeitores, desde que estes não façam mal à mulheres e aos viajantes pobres, que por lá passassem.
Desesperada de saudades, Sílvia foge com a ajuda de um ancião, Eglamour, funcionário do palácio. Os dois acabam parando na floresta onde Valentim estava vivendo, como chefe dos malfeitores. Por um descuido de Eglamour, Sílvia acaba sendo sequestrada por um dos bandidos, que não lhe faz mal algum, apenas deseja apresentar-lhe a Valentim. No meio do caminho, aparece Proteu, que liberta-a. Júlia segue o seu amado e ao perceber que Sílvia fora salva por Proteu, teme que por gratidão, a donzela se apaixone por ele. Valentim aparece e Proteu envergonhado, confessa-lhe tudo que fez para separá-lo de Sílvia. Valentim perdoa-o e diz que se for para fazer o amigo feliz, entrega o amor de sua vida em suas mãos. Neste instante, Júlia desmaia, e todos descobrem que o pajem Sebastião, é na verdade a donzela de Verona. Ao descobrir que Júlia viera de tão longe para encontrá-lo, Proteu percebe que o amor por ela, voltara com a força de um rio. Túrio aparece com o Duque de Milão e ambos tentam convercer à Sílvia a voltar com eles para o palácio. Valentim enfrenta Túrio e diz que se este der mais um passo em direção à Sílvia, ali mesmo morrerá. Túrio foge desesperado e diz que não morrerá por quem não lhe quer. O Duque de Milão ao perceber que Túrio, embora fosse um nobre, é um covarde, concede a mão da filha em casamento a Valentim.
Os quatro seguem viagem para Verona, onde casam-se e vivem felizes para sempre.
Esperanza continuou por algumas horas a ler e reler esta história. Achou lindo o caráter de Valentim, que não deixou-se abater, mesmo quando descobriu a desonestidade de Proteu. Pensou no amor de Júlia, que sobreviveu, mesmo sendo humilhada todo o tempo. Pensou em “Os Dois Cavalheiros de Verona”. E pensou na própria vida. Lembrou-se das vezes que teve que sacrificar a si mesma para que o outro fosse feliz. “Parece um contracenso” – pensou. “Mas às vezes a gente tem que aprender a perder para ganhar”. Dito isto fechou o livro, deu uma gargalhada, e morreu.
A ORDEM DAS ÁRVORES ™ © copyright by betto barquinn 2011
TODOS OS DIREITOS AUTORAIS RESERVADOS BY BETTO BARQUINN
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Genial, Betto! Você capta a alma das coisas. Acho isso fantástico. Você me lembra muito Clarice Lispector. Ambos são emotivos, inteligentes, formidáveis. Você já deve ter ouvido isso um milhão de vezes, mas seu texto parece de fato com o da Clarice. Amo muito esse blog, cara! Um forte abraço!
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