ROUXINOL





Nas muitas andanças da vida, ele descobria-se agora inteirado de si mesmo, capaz de sublimar o amor, e vivenciá-lo de uma forma, que o faria galgar algum degrau da escala evolutiva. Era homem bom, dedicado aos ensinamentos do Cristo. Vivia de forma serena, comungando os doces encantos da vida, com aqueles que dele se aproximavam. No seu apostolado cristão, não dobrava-se diante das críticas daqueles que julgavam pelo simples prazer de apedrejar, os que falam em nome da poesia universal. Dizia que estes não tinham visto a Deus. Portanto, enxergavam o mundo com o míope olhar de quem precisa de óculos. Eram os chamados doentes da alma, cuja parca visão espiritual, levava-os a equívocos típicos da infância. 

Tudo que saía da boca daquele homem vinha do mais profundo de seu coração. Era capaz de encantar pelo simples fato de existir. As suas palavras eram de uma doçura tão grande, que o adocicado era palatável à língua. De fato merecia toda a atenção. Ainda mais nos dias de hoje, quando a sociedade parece viver abarcada na solidão, que é o dilema da nossa época. O individualismo tornou-se uma epidemia. As pessoas vão e vêm, e retornam às suas casas, cada vez mais vazias. É amigo desprezando amigo. É pai que não cumpre a sua missão de educador. É mãe que compensa a sua ausência com algum mimo, que obviamente não preenche o oco espiritual nem dela nem de seus rebentos. Há também aqueles que passam a vida apaixonados, mas não se dão conta do que é o amor. E os outros que nem se permitem amar. Homens e mulheres que fazem do isolamento o aprisionamento de seus corpos. Espíritos encarcerados na masmorra de si mesmos.

Por conseguinte o ser humano vaga perdido, ofuscado pelo dinheiro, pelo poder, pela raiva, pela inveja, pelo preconceito, pelo hedonismo. Parece que procuramos no outro o que falta em nós. Aí damos com os burros n’água, porque o outro também procura em nós, o que não tem. Daí se dá aquele velho círculo vicioso do ‘dai-me o que não tenho que te darei o que me falta’. Por isso ele dizia que o maior crime que a um é dado cometer é não perceber no outro o melhor de si mesmo. Quando caminhamos pelas bifurcações da vida, preferindo o atalha das vicissitudes humanas ao ardor da estrada, acabamos nos perdendo no labirinto de nós mesmos. Cada um tem seu próprio destino. Todos nós temos uma missão a cumprir. E até onde sabemos: todos os caminhos levam a Deus. Alguns adiantam-se, chegando aos objetivos divinos mais rápido. Outros, atropelam-se, enfiando os pés pelas mãos. Mas todos, independente do que sejam e do que façam, cedo ou tarde chegarão à Casa de Deus.   

Ele é o tipo de pessoa que diz coisas assim. Fala com a autoridade de um espírito que já viveu o bastante, para entender que “amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo”, é mais fácil do que a gente imagina. É preciso antes de tudo despir-se do orgulho e da vaidade. E uma vez nu, recompor-se com a vestimenta da humildade e da caridade. Então quando se diz “fora da caridade não há salvação”, também se fala que um espírito humilde é capaz de perceber que “as muitas moradas da Casa de meu Pai” é a eternidade do agora.

Se a felicidade está aonde a gente está, então todos os dias são o primeiro passo para o infinito de nós mesmos. Neste momento estamos na Terra: sete bilhões de pessoas em busca de si mesmas. Iniciamos a nossa caminhada no dia que Deus nos criou. E de lá para cá, de espíritos simples e ignorantes, conforme a vontade do Pai, seguimos rumo ao encontro de nós mesmos. Algum dia pegaremos o retorno de volta para casa. Ou seja: para Deus. E o que é Deus? É Aquele que habita em nós, profundo e indivisível, que está em todas as nossas partes, dentro e fora dos nossos semelhantes. E quem são os nossos semelhantes? São todas as criaturas de Deus: do mais simples grão de areia ao universo equidistante; tudo é Deus. Por isso que não devemos desprezar a ninguém, porque quando menosprezamos a quem quer que seja, estamos ferindo profundamente Àquele que nos gerou. Aí está a função do “criados à imagem e semelhança de Deus”: provar que todos fazemos parte da natureza divina.

Depois de ouvi-lo falar tantas coisas lindas, acabei adormecendo num cantinho de mim mesmo, despertando no céu, um tempinho depois. Suas palavras eram música para os meus ouvidos: como o canto do pássaro; como asas para o rouxinol. Quando acordei, um cadinho meu, sorria. O restante de mim, aquilo que chamamos de espírito, estava iluminado à frente do espelho de mim mesmo, feito o sol do meio-dia. Ele, que fora meu amigo na Terra, agora era meu amigo no céu. Seguimos vivendo e aprendendo. Hoje fazemos parte da mesma família espiritual.

– A vida continua, companheiro – ele disse.

– Bem-vindo à verdadeira vida!  – respondi.




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