ALÉM DO HORIZONTE



A humanidade tem vivido dias ferozes. Vemos diariamente nos noticiários, a barbárie tomando conta das nossas casas, entrando e saindo por todos os lados, e nos deixando cada dia mais aflitos. Assistir TV tem sido uma verdadeira Via Crucis. Os filmes são violentos. Os telejornais só trazem desgraça. As novelas quando não estão falando de aberrações morais, mergulham no hedonismo e na falta de ética. É tudo um grande engodo alienante, que leva o indivíduo a loucura. O ser humano é tratado como objeto descartável. Mas acontece que não somos descartáveis. Temos sentimentos: nós sonhamos. Entretanto temos vivido tanto tempo mergulhados no pesadelo, que para emergirmos do lamaçal que nos encontramos (ou nos perdemos), seria necessário que compreendêssemos que viver não é o atoleiro que se nos apresenta. A fé virou motivo de piada: a fé em si mesmo, no outro, na ciência, em Deus, na humanidade, na verdade intrínseca, na vida. Parece que aquele que crê é mais louco que os outros. Como hoje ninguém pode perder tempo, parar alguns instantes e meditar sobre si mesmo, é algo inaceitável. Acostumamo-nos com a ideia de que “time is money” e caímos na armadilha do materialismo, que nega a existência do espírito: aquele que sobrevive à morte do corpo físico, que é a nossa casa imaterial, nossa sabedoria infinita, nosso bem incorruptível, nosso eu supremo; nosso habitat eterno. 

Para uma sociedade consumista, onde o imediatismo conduz os relacionamentos humanos ao calabouço das paixões, fica fácil compreender porque estamos ficando cada vez mais individualistas. Manter um relacionamento de longa data, seja de amizade ou de casamento, virou total perda de tempo. Para quê ficar ao lado de alguém por décadas, vê-lo envelhecer, perder a fluidez do pensamento, definhar e morrer, se em cada esquina existe alguém disposto a servir como peça de reposição afetiva? Por isso é mais barato criar relações passageiras, onde todos se divertem e ninguém se aborrece, do que construir elos profundos, onde todas as partes terão que adaptar-se umas as outras. Vemos a banalização da mulher, como se o espírito feminino fosse um pedaço de carne exposto no açougue, e não um ser pensante, que vale muito mais do que cinco minutos de prazer. Coisas como o racismo e o preconceito são hoje tão abomináveis, que ter que voltar ao mesmo tema, batendo sempre na mesma tecla, tornou-se algo chato e cansativo. E mesmo enfadonho, o que deveria ter sido banido da sociedade a séculos, continua sendo corriqueiro, como se a cor da pele do outro, a crença político-filosófica ou a orientação sexual, entre outras coisas, fosse um crime.

A sociedade anda mal das pernas. E bem sabemos que não há homem saudável em um espírito doente. Tornamo-nos supérfluos para nós mesmos. É o desamor co-habitando todos os cantos da nossa alma. Se o ser humano não ama a si mesmo, como irá amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo? Certamente da forma mais errada do mundo, confundindo amor com paixão, comparando fé com fanatismo, destruindo a possibilidade de crescimento, esquecendo-se de ser caridoso consigo e com o outro,  banalizando os sentimentos, e pegando o atalho mais fácil, que é o do ódio, da ausência do perdão e da impossibilidade de amar.


A nova ordem mundial é a bagunça. A desordem tornou-se oficial. Embarcamos na canoa furada do politicamente correto, sem sabermos de nós, sequer o que somos. Repetimos a velha fórmula do se dar bem a qualquer custo, e esquecemo-nos de pagar a conta. Contudo a fatura chega quando menos esperamos. Somos uma sociedade decadente, tentando se equilibrar numa prancha de isopor. Apega-mo-nos à ciência da informação, às inovações tecnológicas, ao desenvolvimento científico, ao apogeu do plástico, e não nos demos conta de que o organismo humano continua o mesmo. Se a matéria é o que nos importa, o que levamos daqui quando morremos? Viramos espíritos com cérebro de palha, verdadeiros espantalhos morais, mais perdidos do que cego em tiroteio. Temos um passado repugnante, um presente inexpressivo e um futuro omisso. Onde estão as grandes verdades humanas? Onde foram parar os pensadores? O que foi feito do desejo de ser feliz? Se a vida é algo constante, se todo o universo conspira a nossa favor, por que nadar contra a maré e desertar de si mesmo?


Desistimos de raciocinar quando percebemos que pensar dá trabalho. Da mesma forma que desistimos de amar quando percebemos que não gostamos de nós mesmos. Disputamos amigos virtuais, passamos horas na internet, nos aborrecemos por qualquer coisa, nos vendemos por qualquer preço, tornamo-nos bipolares; comportamo-nos tal criança mimada, que ao primeiro não, declara guerra ao mundo. Somos os grandes ditadores da atualidade, querendo que tudo seja de acordo com o nosso pensamento aleijado. E quando vemos alguém propondo o diálogo, dizendo que a vida não é só ganhar dinheiro, apedrejamo-no em praça pública, para que cale a boca e sirva de exemplo para aqueles que ousarem se manifestar a favor da boa convivência entre os homens. Estamos doentes, sim. E o pior: não nos damos conta disso. Negamos que precisamos de ajuda porque nos julgamos invencíveis. E no afã de deixar tudo como está, afinal de contas em time que está ganhando não se mexe, enfiamos os pés pelas mãos. Mas acontece que não estamos ganhando. Estamos perdendo. Perdendo o nosso tempo, desperdiçando as virtudes do outro, passando pela vida como passageiros de um trem fantasma. Aí vem o medo, a depressão, a síndrome do pânico, a vigorexia, a bulimia, a anorexia, o tédio, a solidão, o autocídio, a falta de perspectiva. Vive-se cem anos sem a menor qualidade de vida. E quando alguém morre, quando quem amamos parte desta para melhor, caímos em desespero, porque perdemos o pouco que conquistamos, nos despedimos de tudo que conhecemos, e percebemos que um dia também iremos morrer, mas que não estamos nem um pouco preparados para isso. Somos a bússola quebrada. Somos o GPS do acaso. Temos o vazio como destino e a perda como finalidade de vida. Só que viver não é isso. Viver é a crença no pensamento e na arte, na criatividade, na construção de uma sociedade melhor.


Não é meia dúzia de notícias ruins, ou um milhão delas, que vai me fazer desacreditar em mim mesmo. Não é porque dizem que o ser humano não presta, que vou me jogar na lata de lixo. A fé que move montanhas é aquela que traz mudança interior. Tem muita gente boa no mundo. Mas parece que o bem é irrelevante para a mídia. Eu acredito no ser humano. Acredito naqueles que não aparecem na TV. Acredito nos que vivem no anonimato. Porque eles existem e estão por aí fazendo o bem sem olhar a quem: sem que para isso precisem da aprovação de terceiros.


A verdadeira fé é a fé raciocinada. A fé raciocinada é aquela que coloca o amor em primeiro lugar. 


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