NOVA COPACABANA
Ela era corista em uma boate de quinta em Copacabana. Sonhava em ser vedete. Mas tinha talento para o drama. Devia ter estudado teatro ou ido trabalhar num circo. Ali não tinha espaço para ela. O que tinha que fazer era pintar os lábios de vermelho, rebolar para lá, rebolar para cá, e mostrar as pernas. Os frequentadores daquele inferninho, saíam do trabalho com o objetivo de terem ali, o que não tinham em casa. Queriam apalpar as carnes de uma mulher. Seja ela quem fosse. Sejam carnes quaisquer. As esposas não eram dadas a tais desfrutes. Se os maridos queriam chamego, que fossem procurar na rua. Então eles iam. Não importava com quem fosse. Não importava nada. O que eles queriam era mão naquilo e aquilo na mão.
Por isso ela era uma estrela. Uma estrela de magnitude duvidosa, diga-se de passagem. Pouca luminosidade, é verdade. Mas ainda assim uma estrela. Quando subia ao palco com seu maiô dourado, o público ia ao delírio. Dizer público, é um exagero, eu sei. Era meia dúzia de gatos pingados, vira-latas que só, que estavam mais para ratazanas de bigode do que para uma platéia de intelectuais. Eram homens-porcos, que estavam ali para chafurdar na lama: literalmente. Pois bem... Quando ela aparecia nua atrás de um biombo, aquela meia dúzia de nada, desvariava. Alguns mais afoitos passavam-lhe a mão. Outros, mais tímidos, ficavam com cara de bobo. Eram uns meninos grandes. Todos, sem exceção. Aliás, tinha uma exceção, sim. Havia ali um rapazinho, franzino que só, que ia de mesa em mesa oferecendo charutos. E como se fumava naquele lugar! Era uma nuvem de fumaça tão espessa, que quando todos soltavam suas baforadas ao mesmo tempo, mal dava para vê-la no palco. Se estivesse nua ou vestida dava no mesmo. A fumaça tapava-lhe a visão da platéia. E quem estava na platéia não a via no palco. Parecia um bando de cegos confundindo-se com a própria sombra. Era uma turba de lunáticos, que de tão desnecessária, dava até pena. Pois então... No meio daquela velhacaria, havia um rapaz que vendia charutos. Era tão jovem, que de certo mal havia largado as fraldas. Devia ter uns vinte anos, mas tinha cara de quinze. Como ela, o rapaz estava ali por engano. Ele também tinha talento para o drama. É outro que devia ter ido estudar artes cênicas ao invés de meter-se num Bataclan.
Tanto o rapaz quanto a moça que ganhava a vida mostrando as partes, pareciam nascidos um para o outro. Mas ambos não sabiam disso. Ainda. Enquanto ela vivia de tirar a roupa para ganhar o pão de cada dia, ele ficava ali entre as mesas. Por isso vê-la nua tornou-se rotina. De tão acostumado, já nem olhava mais para o palco. Pois ele sabia de cor e salteado como ela era: busto durinho, cinturinha fina, bumbum arrebitado, pernas grossas. Era a típica mulher brasileira, com toda a abundância da forma, estilo violão. E embora ele soubesse que ela era muita areia para o seu caminhãozinho, por quê não fazer duas viagens?! Foram se apaixonando aos poucos. Ela do palco. Ele da platéia. Às segundas ele trazia-lhe uma rosa em botão. Às terças ela agradecia-lhe o regalo com um beijinho na testa. Às quartas ele oferecia-lhe um bombom. Às quintas ela sorria. Às sextas ele vinha com uma poesia no bolso. Aos sábados ela deixava-lhe com uma marquinha de batom. Aos domingos passaram a encontrar-se no parque. Domingo era dia de pipoca. Domingo era doce como maçã do amor.
Ficaram tão acostumados um ao outro, que quando viram, já estavam casados. Ela, que queria ser vedete, acabou virando dona de casa, com três filhos para criar. E ele, que deveria ter sido ator, virou nuvem de fumaça.
Quando ela soube que ele ia embora para não mais voltar, em silêncio desabafou:
– Já vai tarde! Mas já que vai: vá pela sombra!
Voltou para o Bataclan e nunca mais quis saber de homem.
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