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Mostrando postagens de agosto, 2011

O LEÃOZINHO

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Quando eu era guri, ia todas as tardes ao jardim zoológico, depois da escola. Chegava em casa correndo, jogava a mochila na cama, deitava no chão, e ficava olhando para o teto, imaginando como seria quando lá chegasse. O animal que mais gostava era o leão. Tinha um leãozinho que devia ter a minha idade. Uns quatro ou cinco anos e nada mais. Talvez seis ou sete, não sei. É... Uns oito ou nove e nem um segundo a mais. Sei lá... Eu tinha três anos. Éramos vizinhos do parque onde ficava o zoológico. Mamãe arrumava-me todo. Brilhantina no cabelo, roupa de festa, tênis de mola e uma frasqueira disfarçada de sacola. Nela levava doces. Muitos doces. Tinha algodão-doce, paçoca, pirulito, brigadeiro, sorvete, suspiro, torta de limão, maria mole, pé de moleque, cocada, maçã do amor, caramelo, pipoca e bala de goma. O leãozinho adorava! Ele não podia comer. Era proibido alimentar os animais. Mas ele comia. Dava escondido. Colocava as guloseimas no bolso e ia dando aos pouquinhos. Se via o guarda d

É O AMOR

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Trezentos homens num barril,  Trezentos ratos num porão, O amor é feito aquela água, Que fica no fundo do balde, Cheio de sabão. O amor é feito Terremoto, Maremoto, Tsunami, Lava de vulcão. O amor tem gosto de inhame, Cheira à fel, Favo de mel, Barriga de aluguel. O amor é céu, Ensolarado como uma estrela. O amor é feito de plástico, O amor é feito de plástico, O amor é feito de plástico. O amor é coisa rara, O amor é uma peça de época, O amor é uma peça de roupa, O amor é uma grife, O amor é vendido no brechó, O amor é vintage. Eu sei que o amor trás sorte, Eu sei que o amor tem cheiro de morte, Eu sei que o amor é uma cova rasa, Cavada a dedo, À pé, À pá, À mão. O amor cavado à mão, O amor pisado ao chão, O amor, O pé, A pá, A mão. Trezentos homens num barril, Trezentos ratos num porão. O amor é feito aquela água, Que fica no fundo do balde, Cheio de sabão. É o amor passando lá? Saravá! Deixa o amor passar! É O A

ESPUMAS AO VENTO

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Ela gostava de apagar o fogo com gasolina. Tinha um marasmo nos olhos e um cigarro entre os dentes. Tinha um orgasmo nos cornos e um sorriso entre os dedos. Armazenava sentimentos em caixas de sapato. Segunda-feira: dor. Terça-feira: dor. Quarta-feira: dor. Quinta-feira: dor. Sexta-feira: dor. Sábado: dor. Domingo: saía para passear. Tinha espumas ao vento. Assistira “Lisbela e o Prisioneiro”, mas jogara o filme fora, e comprara um livro de culinária africana. Quando os dias eram azuis: blues. Quando o dias eram pus: ai-ai, ui-ui. Vivia na câmera do medo. Sua vida era um plano sequência de vinte e cinco segundos. No que nela havia luz: a sombra era perfeita escuridão. Seu esconderijo fora filmado com uma máquina fotográfica digital. Embora fosse mais cara que a maioria das pessoas: era descartável e funcionava à pilha. Um cuidado minimalista na decupagem, não funcionaria com ela. Talvez um pires e uma luz à vela. Um corpo quente no mármore frio. O assoalho de madeira contr

O AMOR É FILME

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O amor é um dedo de gim num copo de plástico. O amor é o antropológico escondido no bolso da ficção. É como esparadrapo sem cola. É como grude no dente. Puxa-puxa. Quebra-queixo. Goma. Chiclete. Despertador.    O amor como manifesto antropofágico é fraco. O amor como manifesto artístico é forte. O amor é sentimento verborrágico. O amor é frágil. O amor não sabe amar. Mas há amor: há. O amor limítrofe do risco. O giz riscando o quadro como dois e dois. O amor pode ficar para depois. Não. Amor tem que ser agora. A qualquer hora. Não vejo a hora do amor chegar. O amor é o patrimônio imaterial da humanidade. O amor é tarde. O amor não tem idade: para amar há de se ter vitalidade. O amor é pasta de dente. É adstringente. É fio dental. Suave como a brisa que satiriza o antes e o depois. O amor pode ficar para depois. Não. O amor tem que ser à aurora. Tem que ser a dois: como feijão com arroz. Amor: outrora. Amor: demora. Não vejo a hora do amor passar.     O amor é um ded

TA-HI

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Ele fora movido pela pobreza dos afetos. Desde tenra infância era assim: a pobreza de sentimentos rondava-lhe à alma como moscas de padaria. Era alguém avesso à palavra. Quando falava alguma coisa, o silêncio predominava absoluto. Tinha dias que mergulhava na cama. Não saía de lá nem por um decreto. Noutros, ficava parado no tempo. “Dias de lamento” – pensava. Dias que mergulhava no esquecimento. Dias em que as horas tardavam a passar. Tinha a alma de um moribundo. Não possuía o amor que dilui o ódio. Era o doce amargo de uma vida agridoce. Seja lá o que fosse: murmurava. Se tinha ganas de correr: corria. Se tinha ganas de ter alegria: alegria. A felicidade era-lhe um breve momento de espasmo e de dor. Era um homem fadado ao tédio e a preguiça. Havia nele um pássaro de borracha plantado à janela. Havia nele uma aguarela sem cor. A vida fora embora. Saira para dar um passeio e no meio se perdera. O rato comeu o fio do ar condicionado. O rato comeu o arado. Ele era o rato. Sabia-se rat

ESTRELA MIÚDA

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Não faz sentido. É... Não faz sentido. Viver não faz sentido. O mundo diante dos meus olhos: não faz sentido. O Alzheimer caiu-me como uma bomba. Hoje vivo um flashback: Amanhã me lembro do que hoje esqueço. O Alzheimer é o eterno recomeço. Lembro-me quem fui. Mas não sei quem sou. O presente preso numa lata de memória em conserva. Compácta. Hermética. Indepurável. O Alzheimer é o eterno recomeço. Hoje me lembro do que amanhã esqueço.    ESTRELA MIÚDA ©  copyright by betto barquinn 2011 TODOS OS DIREITOS AUTORAIS RESERVADOS BY BETTO BARQUINN

QUANDO ASSIM

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Estava no telefone com uma amiga muito querida, que dizia-me que tinha um carinho muito grande pelo filho de sua empregada doméstica. Minha amiga tem dois filhos lindos: João e Maria são de fato espíritos muito iluminados. Ela dizia ter tido sorte. “Ter filhos fortes e saudáveis nos livra de muita preocupação” – concluiu. E eu respondi: ‘É a mão de Deus’. Acontece que no seio dessa família abençoada, surgira Maria de Lourdes, a secretária do lar, com seu filho no ventre. Minha amiga dera-lhe guarida e o menino cresceu correndo pela casa. Pedro Paulo é luz no fim do túnel: tem um quê de esperança e algo mais de alegria. Acabou tornando-se parte dessa família. Minha amiga nunca fez distinção entre os dela e o da outra. E esse amor só vem aumentando. Ela faz tudo que pode pelo garoto. Se dá um presente para os filhos, lá está Pedro Paulo sendo presenteado também. Os três estudam na mesma escola. Os três fazem o mesmo cursinho de inglês. Os três são inseparáveis. Vistos de longe: parec

EU AMO A HEBE

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Ontem, Hebe Camargo ligou-me, convidando-me para ir ao seu programa. Chegando lá, deu-me um ‘selinho’, e disse-me que eu era uma ‘gracinha’. Eu amo a Hebe! Ela tem uma alegria de viver, que Deus lhe pague: fruto de sua personalidade arrebatadora. Na mitologia grega, Hebe é a deusa da juventude, filha legítima de Zeus e Hera. Dona de uma beleza ímpar, a Hebe dos gregos, tem muito a ver com a nossa: ambas são adoráveis! A Hebe grega é filha do rei dos deuses, aquele que é o soberano do Monte Olimpo, e deus do céu e do trovão. Sua mãe é a deusa do casamento. Irmã e esposa de Zeus, Hera rege a fidelidade conjugal. Ou seja, a Hebe grega é filha do rei dos deuses e a Hebe brasileira é filha do Deus dos deuses: Adorável! Mas falemos da nossa: Hebe Camargo nasceu em Taubaté em 28 de março de 1929. Saída de uma família humilde, formou com a irmã, Stella Camargo Reis, a dupla caipira “Rosalinda e Florisbela”. E desde então, nunca mais parou. Da música para o rádio foi um pulo, indo tornar-se pos

I TRY

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Ela dizia que o amor é a chave que abre todas as portas. A exemplo do Cristo: fazia o bem sem olhar a quem. Tinha o dom de estar no lugar certo; na hora certa. Exercia o domínio sobre o outro no melhor sentido da palavra. Aprendera a ver as qualidades do ser humano. Nunca enxergava defeitos. Utilizava a caridade para melhorar a vida de todos. Tinha o coração do tamanho do mundo. Amava a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesma. Tinha vivido muita dor. Mas descobrira o amor. Por isso nunca perdera a esperança. Pandora era assim: um doce. Na mitologia grega fora a primeira mulher criada por Hefesto: deus do fogo, dos metais e da metalurgia. Surgira como punição à Prometeu, por ter roubado o fogo sagrado do Olimpo, e tê-lo dado aos homens. Fora co-criada por Atena: deusa da guerra, da civilização, da sabedoria, da arte, da justiça e da habilidade. Recebera dos outros deuses, sob permissão de Zeus, todas as qualidades divinas. E recebera de Hermes: a traição e a mentira. Pro

MISERY

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Ele acabara de ler “Miséria da Filosofia” de Karl Marx, antes mesmo de começar a ler “Filosofia da Miséria”, de Pierre-Joseph Proudhon. Trocara os livros e ficara confuso. Tinha algo de sorrateiro no mundo. Tudo era suspeito. ‘Não toque em nada!’ – ele disse. ‘Jamais confie em ninguém’. Sem saber o que fazer: comeu a capa dos livros. O gosto era bom. O de Marx tinha gosto de suspiro. O de Proudhon tinha gosto de bombom. É até uma heresia fazer esse tipo de comparação, mas ele fez. ‘O gosto do primeiro era doce’. ‘O gosto do segundo era bom’. Mas a leitura do primeiro livro, obrigava-lhe, invariavelmente, a ler o segundo. Como estava com pressa: comeu o prefácio dos dois. Como ainda estava com fome, devorou a contra-capa e deixou os tomos para depois. Leu tudo bem rapidinho para o restante comer. Com água empurrou goela abaixo: “Sistema das Contradições ou Filosofia da Miséria”. Já que estava satisfeito de ter lido e comido os dois livros, saboreou-lhes o epílogo, palitou os dentes, apa

BALADA DA ARRASADA

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Clara era tão pobre, que pediu de presente de natal, um prato de comida. Depois de ficar dias com fome , sentiu-se mal, caiu num sono profundo e teve um sonho: No sonho Clara era uma princesa, dessas de contos de fadas. Tinha um irmão, cujo nome era engraçado de pronunciar: Aabran  –  aquele que tem garra e força. Aabran era um bom menino, mas como todo menino, queria ser rei. Achava que se tivesse poder e dinheiro, poderia dominar o mundo. Sonhava com carros importados, casacos de pele, mulheres aos montes, castelos de ouro, juventude eterna e beleza infinita. Aabran tinha o espelho da vaidade grudado no rosto. Clara amava o irmão. Por ele era capaz de fazer do inferno o paraíso. Passava as tardes bordando. Como no reino não tinha casacos de pele, pois era proibido tosquiar animais, tecia para o irmão um casaco de lã. O irmão não gostava, tinha alergia a pelo sintético, mas como casaco é casaco, e para o frio cobertor é luva, Aabran usava. Um dia o rei morre, e deixa no trono, a rainh

VISITAS LIMITADAS AO PARAÍSO

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Ela nunca saía de casa, Às vezes passava as tardes no paraíso. Vivia numa choupana ensolarada, A duas léguas do céu. Tinha ganas de conhecer o mundo, Tinha ganas de com Ícaro voar. Mas limitava-se a ficar em casa, Sonhando com as ondas do mar. VISITAS LIMITADAS AO PARAÍSO™   ©  by betto barquinn 2011 TODOS OS DIREITOS AUTORAIS RESERVADOS BY BETTO BARQUINN

MOVES LIKE JAGGER

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Ele era de pele e carne vestido, E de ossos e nervos tecido. Era como se nunca fora. Tinha confiança, Porque nele havia esperança. Amava demais, Em nome do bem de tudo era capaz, Vivia os seus dias para ajudar. Tinha um bom coração, A felicidade na palma da mão, Fazia o bem sem olhar a quem. Se via alguém triste, Alegria levava, Se via alguém passar fome, Tirava alimento da alma, Se via alguém sentir dor, Doava-lhe amor. Tinha nome de anjo, Chamava-se Michael Philip Jagger, Mick, Era um homem sagrado, Um eterno "The Rolling Stones'' man, A desnudar-se no céu. Jagger, Um cidadão do mundo, À bater asas de papel. Às vezes chorava escondido, Com medo que vissem sua dor, Não por vergonha, Mas por zelo, Pois era todo amor. Queria ser bom exemplo, À humanidade ajudar, Porque se na vida existem espinhos, Há flores em todo lugar. Sabia que muita gente vivia, Em busca de paz e sossego, Mas só se conquista a alegria, Quando se vive primeiro. Viver não é sofrimento, Amor não rima com