10 COISAS QUE PRECISO FAZER ANTES DO FIM DO MUNDO




Dizem que cada vez mais, com o envelhecimento da população mundial, todos nós vamos acabar sozinhos. Então, se é para ter a mim como única opção de companhia, que seja uma velhice cercada por livros. Lembro-me de ouvir a minha avó dizer que ‘o mundo só acaba para quem morre’. Coisa que só quem é velho diz. Afinal, há de se viver muito para chegar à conclusões extremas. Pois que seja… Dentre as 10 coisas que preciso fazer antes do fim do mundo, se é que um dia o mundo vai acabar, ou melhor, se é que com a morte do corpo físico, o espírito também ganha sua cota de pá de cal; então que eu saia daqui com a alma mais rica, mais humilde, mais sábia, e acima de tudo, mais bonita: agraciada pelo encontro com Deus. Mas falávamos das 10 coisas que preciso fazer antes de morrer, ou melhor, antes do ‘meu’ fim do mundo. Então vamos listá-las:

A primeira delas, e creio que seja a última também, será me espiritualizar. Pois se quando partimos daqui, levamos conosco só o que temos no espírito, preciso ler mais Thomas Merton. Ele fala coisas sobre ‘a verdadeira e a falsa solidão’ que eu ainda não compreendo. É isso… o primeiro e o último a fazer é ler Thomas Merton.

A segunda delas será caminhar sobre as águas. Sei que isso só Jesus fez, e longe de mim querer me comparar ao Cristo. Mas creio que caminhar sobre as águas seja mais fácil do que a gente imagina. É só fechar os olhos e ver Deus do outro lado da vida. Aí a gente fica leve e atravessa o mar andando. Até porque o meu mar interno, é mais largo e profundo do que parece, visto daqui da superfície. Digo isso, porque quando mergulho em mim, vejo um azul de um azul tão azul, que compreendo que Deus se manifesta em tudo que somos. Logo eu, que sempre me achei raso e superficial, vejo que meu mar interior é um oceano de sabedoria. Viu… caminhar sobre as águas fica fácil, quando a gente percebe que se cair dentro de si, não morrerá afogado. Porque em nós não há nenhum abismo disfarçado de banco de areia. Quando olho para mim: o melhor de mim me olha de volta.    

A terceira delas será voltar a andar de bicicleta. Não faço isso desde os dez anos de idade. Isso mesmo… preciso voltar a andar de bicicleta antes do fim do mundo.

A quarta delas será voltar a ler Fernando Pessoa. Tenho negligenciado a convivência com o poeta português. Horas, porque estou flertando com Carlos Drummond de Andrade. Horas, porque não vivo sem Luís de Camões. Mas há espaço aqui para todo mundo. Tenho a alma grande; e o coração, por mais que ame, ainda tem seus espaços inabitados. Sou uma casa cheia de cômodos. Portanto, preciso voltar a ler Fernando Pessoa.       

A quinta delas será plantar uma árvore. Nem que seja um pé de feijão. Tudo bem que feijão não dá em árvore: feijão em rama. Mas sempre carrego em mim aquele conto de Benjamim Tabart: “João e o Pé de Feijão”. Isso mesmo… a quinta coisa que preciso fazer antes do fim do mundo é plantar uma árvore.

A sexta delas será me casar. Um indivíduo não pode ser feliz sem pelo menos tentar ser feliz. E acredito que essa felicidade passa pelo casamento. Não necessariamente o matrimônio, mas o vínculo estabelecido entre duas pessoas. Eu ando muito sozinho, sabe. Deve ser essa tal ‘síndrome de abstinência do fim do mundo’. Preciso me casar antes que o mundo acabe.

A sétima delas será ter um filho. Mesmo que eu não me case, quero ter um filho. Até porque filho adota-se. Filho não precisa nem de mulher nem de homem para fazer. Filho a gente acha pronto. Tem muito filho por aí precisando de um pai e de uma mãe. Eu posso ser esse pai, ainda que não encontre uma mãe para esse filho. Se é verdade o que dizem, ‘que através do filho o homem vive para sempre’, quero me eternizar na vida dessa pessoa. E mesmo que não seja meu de sangue, pouco importa. A última coisa que se pensa nessas horas é no DNA. A menos que seja o DNA espiritual. O sangue é uma bobagem quando o assunto é o amor. O que é o sangue afinal, senão um ‘tecido conjuntivo líquido que circula pelo sistema vascular dos animais?’. De certo, filho meu ou filho de outrem, terá a porção Deus necessária para chamá-lo de irmão. E se é verdade o que tomo como verdade, que os verdadeiros laços afetivos são edificados na alma, então meu filho saindo daqui ou dali, será meu de qualquer jeito. Portanto, antes do fim do mundo, preciso ter um filho.

A sétima delas será reler todos os livros de Clarice Lispector: àqueles escritos por ela e àqueles que falam dela. A seguir: “Perto do Coração Selvagem”, “O Lustre”, “A Cidade Sitiada”, “A Maçã no Escuro”, “A Paixão Segundo G.H.”, “Uma Aprendizagem ou Livro dos Prazeres”, “Água Viva”, “Um Sopro de Vida — Pulsações”, “A Hora da Estrela”, “Alguns Contos”, “Laços de Família”, “A Legião Estrangeira”, “Felicidade Clandestina”, “A Imitação da Rosa”, “A Via Crucis do Corpo”, “Onde Estivestes de Noite?”, “A Bela e a Fera”, “Cartas Perto do Coração”, — organização de Fernando Sabino, “Correspondência — Clarice Lispector”, — organização de Teresa Cristina M. Ferreira, “Visão do Esplendor —  Impressões Leves”, “Para Não Esquecer”, “A Descoberta do Mundo” (este eu quero ler antes, durante e depois do fim do mundo), “De Corpo Inteiro”, “O Mistério do Coelho Pensante”, “A Mulher Que Matou os Peixes”, “A Vida Íntima de Laura”, “Quase de Verdade”, “Como Nasceram as Estrelas”, “Seleta de Clarice Lispector”, — organização de Renato Cordeiro Gomes, “Clarice Lispector”, —  organização de Benjamim Abdala Jr. e Samira Y. Campedelli, “O Primeiro Beijo & Outros Contos”, “Os Melhores Contos de Clarice Lispector”, — organização de Walnice N. Galvão, “Aprendendo a Viver”; e os que mais me caírem às mãos. Acho que estão todos aí: olhando para mim. Porque quando olho para os meus livros, eles me olham de volta. Se faltou algum, por favor me avise. Pois antes do fim do mundo, este também quero ler.

A oitava delas será ouvir todos os dias o “Hino Nacional Brasileiro”. Uma composição tão bela quanto esta criada por Joaquim Osório Duque Estrada e Francisco Manuel da Silva, não pode ser ouvida de vez em quando. Deve inserir-se pela fenda dos nossos ouvidos até calar-nos a alma. Será a catarse que tanto preciso! Há quem diga que o Brasil é um país complicado. Há quem diga ainda que as coisas aqui não têm jeito. Eu penso o contrário: qualquer lugar que seja cheio de brasileiros é um lugar cheio de esperança. Não dizem por aí que ‘não desistimos nunca?’. Então… vou hastear minha bandeira nacional e ficar cantarolando o hino do meu povo: nem que seja por pura teimosia! Porque não quero me apartar da minha terra em momento algum da minha vida. Esquecer o Brasil? Nem morto!

A nona, já que estamos no terreno da música, será ouvir minhas canções prediletas. De todas as que existem, e que tive o privilégio de conhecer, as que mais me emocionam são: “Foi Deus Quem Fez Você”, — imortalizada na voz da minha amada Amelinha; “Te Busco”, na voz da não menos imortal, e por mim amada, Celia Cruz; e “Sukiyaki”, na voz da minha querida e inesquecível Janice Marie. São essas músicas que me fazem dar saltos no ar. São elas que ouço quando estou alegre ou triste. São elas que quero ouvir na hora da minha morte. São elas que quero que toque no meu velório. São elas que quero que cantem na minha missa de sétimo dia. São elas que levarei comigo, quando meu mundo acabar.

A décima será idêntica a primeira: ler Thomas Merton. Porque sei que com a alma purificado, aconteça o que acontecer, ainda serei eu mesmo. E o que há de vir, seja lá o que for, será por mim bem recebido. Preciso me tornar um ser humano melhor.
     
P.S.: Escrever um livro também está nos meus planos do que fazer antes do fim do mundo. Mas aqui só cabem dez. 





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