ALFÔMEGA



Semana passada parei defronte a um sebo, e lá estava “Por Quem os Sinos Dobram” (From Whom the Bell Tolls), de Ernest Hemingway, — olhando para mim. O livro não era caro, mas eu não tinha o dinheiro para comprá-lo. Olhei dentro dos bolsos e nada. Fitei a carteira: estava vazia. Havia alguns trocados guardados em casa. Mas eles eram para pagar as contas do mês. “Melhor não usá-los” — pensei.

Por alguns instantes ficamos; o livro e eu, deslumbrados. Eu, com a ideia de tê-lo em meus braços. E ele, com a vontade de ser meu. Ficamos ali, dois bobos com o sorriso no rosto. Para minha sorte, o vendedor viu que meus olhos brilhavam. Mais interessado em fazer de mim o seu próximo cliente do que tomado pelo desejo de ajudar-me (essa foi a impressão que tive), — aproximou-se de mim. “Por que não entra?” — perguntou-me. “Observei que o senhor está a dez minutos parado à porta. Gostou do livro? Faço um preço especial para o cavalheiro”. Calou-se.
O meu impulso foi entrar na loja, pegar o livro e sair correndo. Como um gatuno. Mas jamais o faria. Sou honesto demais. Nunca cometeria com o outro aquilo que não gostaria que empreendessem comigo. Por isso, educadamente, respondi: “Estou bem aqui, obrigado”. Entretanto, como o vendedor insistiu, entrei na loja. O que posso contar é que não há palavras para descrever o quanto fiquei feliz em ter o livro diante dos meus olhos: sem vidro; sem vitrine atrapalhando o nosso romance. Romance, sim. Namorico; flerte. Fora amor à primeira vista! Era o livro e eu: juntos, finalmente. Envergonhado, expliquei ao vendedor que levaria o livro, se tivesse dinheiro. Para meu espanto, ele contou-me que era o dono da loja. Disse-me também que de tempos em tempos convidava um transeunte para entrar e escolher o que quisesse. “Sério mesmo?!” — perguntei-lhe. “Sim senhor” — o vendedor, que na verdade era o dono da livraria, confirmou. “Então vou levar o Hemingway!” — declarei. “Pois não… aqui está”  — respondeu-me retirando o livro da prateleira. “Pode levar… o livro é seu”. Com lágrimas nos olhos, dei-lhe um abraço fraterno. Tartamudeando agradeci, desejei que tivesse um bom dia, peguei o livro no colo, e fomos embora: “Por Quem os Sinos Dobram” e eu.

Semana passada parei defronte a um sebo, e lá estava, o alimento de minh’alma.
 

  CONTACT CARLOS ALBERTO PEREIRA DOS SANTOS:


ALFÔMEGA © copyright by Carlos Alberto Pereira dos Santos 2013
TODOS OS DIREITOS AUTORAIS RESERVADOS BY CARLOS ALBERTO PEREIRA DOS SANTOS

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

GAROTO DE PROGRAMA

ETERNAMENTE ANILZA!

COLOQUE O AMENDOIM NO BURACO DO AMENDOIM