CUIDAR DE MIM

Ela dizia que um indivíduo que não lê, cria um abismo dentro de si. Constrói ao seu redor um muro tão fácil de se derrubar, que não há brisa que não o leve ao chão. “Quem não cria o hábito da leitura – dizia – é uma presa fácil às armadilhas da vida. Cai em qualquer coisa, porque a sua existência já é o buraco”. 

Ela dizia que para gostar de ler, o indivíduo tem que ser apresentado ao livro desde pequeno. Mesmo que seja um conto numa folha de jornal. Mesmo que seja uma receita de bolo. Mesmo que seja o letreiro de uma farmácia. Pais que não incentivam nos filhos o gosto pela leitura, transformam-os em fracos. Como alguém pode ter piedade sem ter lido sobre a piedade? Como alguém pode trazer amor no coração sem conhecer Fernando Pessoa? “Eu sei – dizia – que alguns afortunados trazem dentro de si a sabedoria universal. São espíritos milenares que aprenderam com a vida, que é a melhor das escolas. Mas a maioria de nós, esse bando de hominídeos com o espírito à rés-do-chão, é necessário ler para crer. O cérebro é matéria que precisa ser solidificada, para que possa se autocondensar”.

Ela dizia essas coisas, depois saía, deixando-me só com meus botões. Aí eu parava para pensar. De fato o livro é a bússola que guia melhor do que qualquer GPS. Ali encontramos a nós mesmos: arrumados e enquadrados no outro. Ali somos físicos mesmo que sejamos espirituais. Ela tem razão: o livro é uma longa estrada.     

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