EL HUECO


Em algum lugar da Europa, dezoito anos depois da Revolução Francesa de julho de 1830.

É uma luta diária. A luta do proletariado contra a burguesia. De um lado a maioria operária, tentando sobreviver ao poder da minoria capitalista. E embora seja minoria, detém o poder do dinheiro; e esse não perdoa quem se coloca à sua frente: atropelando-o como quem passa com o trator na cabeça de um cachorro morto.

A luta é covarde e cruel. Alguém que passe a vida servindo, fazendo multiplicar por mil a riqueza daqueles que o tratam como um souvenir; sem ter sequer a decência de enxergá-lo como ser humano; mas como máquina capaz de os levarem a lucrar rios de dinheiro; o operário, essa gente comum que nasce e morre sem conhecer da vida o mínimo do mínimo; estapeia-se ao vento: horas porque viver é preciso, horas porque sobreviver é necessário. E quem estapeia-se sempre perde; em uma sociedade em que os “fracos” não tem vez. Fracos não porque sejam fracos. Mas porque não têm dinheiro para lutar com seu opressor de igual para igual. Ao contrário de Deus, o opressor não quer que ninguém seja à sua imagem e semelhança. Ainda mais em uma sociedade arbitrariamente desigual. Desigual em renda, desigual em pensamento, desigual em valores, desigual em crenças, desigual em filosofia de vida, desigual em tudo. O que um come o outro joga no lixo: para outro comer. O que um deseja o outro pisa em cima. O que um realiza o outro destrói.

Viver em uma comunidade assim dói. E olha que estamos falando de uma sociedade global. As pessoas foram tão covardemente arrastadas ao valão comum, que viver e morrer foram alçados ao mesmo patamar. E não a um pedestal acima do bem e do mal. Mas a um calabouço abaixo da ética e da moral. A vida tornou-se moeda de troca. Ou melhor, não vale nada o preço de uma vida. Não a vida do homem comum. Não a vida daquele que trabalha a vida toda, dá lucro à meia dúzia de burgueses; e ao final de sua existência, percebe que não construiu nada. Nem uma família dita feliz, nem realizações de foro íntimo que o eleve aos céus, nem elucubrações gerais que o façam sentir-se acima da média. Todos fomos nivelados ao rés-do-chão. Todos valemos menos que uma xícara de chá; que um produto manufaturado ou industrializado; que o fruto do trabalho daquele artesão que resiste bravamente ao escárnio da sociedade (a fome de justiça que corrói-lhe o estômago, a ossificação de seu espírito ou a materialização de sua alma; não como aquele o advento do ser divino que dá vida ao um corpo físico, ao universo e a natureza em geral; mas como uma máquina de relativa serventia, que quando quebra; dá defeito; parcial ou total; perde a sua serventia: seja temporária ou definitiva.

Desde a Revolução Industrial, o homem tornou-se uma peça dessa engrenagem que move o mundo, que a roda da fortuna reduziu a sombras. O ser humano médio hoje vive abaixo da média. E aquele tido como cidadão comum, o que acorda cedo; o proletário-operário; o que está em vias de pauperização ou abaixo da linha da pobreza, faz das tripas coração para continuar vivendo. Em um mundo onde o ser humano é tratado como peça de reposição, sentimentos são jogados fora diariamente. E pior do que sentimentos genuínos sendo transformados em objeto descartável, é o fato da intelectualidade ser tratada como supérfluo. Raciocinar não é mais possível, porque o ser humano é máquina. Não que seja, mas é como é visto por quem assim o quer ver. Como disse William Shakespeare em ‘Hamlet’: “Pode-se pescar com um verme que haja comido de um rei, e comer o peixe que se alimentou desse verme” Ou seja, “um rei pode fazer um passeio pelos intestinos de um mendigo”. Isto quer dizer que para essa gente que manda, pensar é um privilégio dela. Aos outros; ao “resto”, delegam afazeres. E é claro, se para que a burguesia lucre mais, seja preciso colocar um pouco de discernimento na mente dos homens-máquina, “educar”, ou melhor; “adestrar”, vira o mal necessário. Afinal, a burguesia calculou ontem o lucro que terá amanhã: pouco importa que o presente é hoje e a eternidade seja a fração de segundos deste instante. Se for para ficar cada vez mais rico, o capitalista abre as pernas, e ainda diz “eu te amo”. Ledo engano. É apenas uma jogada de marketing, quase sempre pessoal. É como se o burguês dissesse: “Tudo que eu faço é para o seu bem. E se é para o seu bem, é para o bem de todos”. E o proletário, argumenta: “Faz de conta que me engana que eu faço de conta que acredito”.

É assim que a nossa sociedade agoniza diametralmente rumo à cova. E os coveiros são os mesmos que segurarão a alça do cachão e cavarão com as mãos os sete palmos de terra. Mas o processo é longo. Pois a burguesia agoniza, mas não morre. Ou quando faz de conta que morre, deixa no poder os seu herdeiros morais, que pregam a filosofia da miséria. Àqueles que repetirão o seu discurso e manterão o “gado” (a classe trabalhadora; o operariado; o proletário) à rédias curtas.

O capitalismo é uma praga pior que a praga de gafanhotos do velho Egito. Porque ao invés de faraó; e hebreus em fuga rumo à Terra Prometida, vemos quem não trabalha acharcando quem trabalha, e pregando descaradamente a filosofia do “manda quem pode e obedece quem tem juízo”. Os burgueses são os faraós do nosso tempo. O capitalismo é o imperador da nossa Era. Tiraram a aristocracia do poder e comportam-se como nobres. Império de insensatos que se reproduz como ratos. Capitalismo que sobrevive a tudo: como as baratas sobreviverão ao final dos tempos. E o povo, reprimido e suprimido à miséria, virou o microscópico produto de importação e exportação, dessa antropofágica sociedade de classes. Burgueses (famintos) de uma lado; proletários (mortos de fome) do outro.  Ambos vivem e respiram o mesmo ar, embora sejam vidas e ares diferentes. A maioria é asfixiada pela minoria: que nasce, cresce, se reproduz e morre.

Como alguém pode trabalhar a vida toda e não ter nada? Falta de sabedoria ou falta de oportunidade? Pelo que eu saiba, todos nascemos com as mesmas aptidões intelectuais, a menos que; obviamente, tenhamos algum transtorno mental que nos deteriore o funcionamento psíquico global. Então, por que uns tem tanto e outros não tem nada? Por que aqueles que servem valem menos do que aqueles que são servidos? É assim na hora da morte e é assim ao longo da vida. Os aristocratas de outrora tornaram-se os burgueses de hoje. E o camponês tornou-se o proletário de então. A conclusão que chegamos é que trocou-se seis por meia dúzia, quando a questão é quem manda. Agora, quando falamos do dominado, o escravo de hoje vale menos que o escravo de ontem. E como o escravo de ontem não valia o preço de uma vaca, o de hoje não chega a arroba de um bezerro. O cidadão comum tornou-se um estropiado; um desgraçado; que através da mendicância de direitos básicos; e por si só, fundamentais à manutenção e à preservação da vida, marcha não se sabe para onde e muito menos para quê.

Enquanto o dominante achar que o dominado é ignominioso, o mundo será essa avalanche de problemas. A violência está aí e só aumenta: desigualdade, tráfico, preconceito. Somam-se a isso a insânia do álcool e a drogadição moral. De um lado o desemprego e do outro dunas de dinheiro. De um lado a fome e do outro o desperdício. De um lado a decência e do outro a luxúria. De um lado o faraó e do outro a miséria.

Eu temo pelos dias que virão, mas continuo acreditando que o melhor caminho é o da pacificação. Que peguem em armas aqueles que vivem à base do “olho por olho”, dente por dente”. Minha arma é a palavra. E enquanto vida eu tiver, continuarei pregando a paz e o amor entre os homens.                     

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