DADO VICIADO
Ele era viciado em cocaína. Os amigos diziam que havia cheirado a casa toda. Quando ficou desempregado, e se viu sem dinheiro, cheirou a geladeira, cheirou o sofá, cheirou o rádio, cheirou a TV, cheirou o celular, cheirou o salário da empregada: até o pedigrée do cachorro ele cheirou. Se fosse um eletrodoméstico seria um aspirador de pó. Cheirava mais que um tamanduá. Dizem, inclusive, que a aposentadoria da mãe virou pó. Ouvi dizer que a conta de luz, coitada, foi cheirada. Deve ser por isso que ela foi cortada. Todavia um dia resolveu tomar jeito. Entrou para os Narcóticos Anônimos e passou a dizer: “Sou viciado, mas não cheiro”. Não era semvergonhice. Era doença. Mas agora ele está bem. A casa é que anda mal das pernas. Não tem nem cadeira para sentar. Vixe Maria! Cheirou até o mármore da pia! Entretanto, voltou a trabalhar. Nem talco usa para não cair em tentação. Varre a casa todos os dias, espana até a torradeira; poeira lá não tem, porque pó ali não entra. Nem refrigerante de n