SUNDAY MORNING


Um dia de domingo:

Domingo é dia bom para cachorro. Dia de escovar o pelo, abanar a calda, passear na pracinha, correr pelo parque. Domingo é dia de tomar banho, cortar as unhas, deixar o focinho deslizar pelo corpo à procura de uma pulga. Domingo é dia de experimentar a ração nova que está em promoção no supermercado, e dizem, é melhor que caviar iraniano. Domingo é dia de roer aquele osso comprado no pet shop e que tem gosto de gato. Domingo é dia de biscoito canino e tudo mais que o domingo trouxer. Assim é o domingo na vida do cão. Um dia para festejar. E ele e seu dono sabem muito bem o que é isso. Pois vivem como se cada dia fosse o último de todos os outros que virão. Vivem de trás para frente, como se retrocedendo sem parar, chegasse o dia em que renasceriam. Vivem e vivem com a pressa de uma tartaruga em slow motion. Vivem a passos curtos de jabuti. E como correm com lentidão! Arrastam-se pelo mundo como se fossem impelidos a não sair do lugar. A inércia é algo que eles conhecem melhor do que a si mesmos. Afinal, da gente, é o que a gente menos sabe. Supõe, é verdade. Faz que sabe mas não sabe. Pensa, pensa, e nada conclui. Equilibra-se em hipóteses e esbarra em incertezas. Pois nem sempre a gente é o que imagina que é. Engana-se. Na maioria das vezes, a gente não é o que diz ser. A gente acha que sabe tudo do mundo, mas da gente mesmo, a gente não sabe. Por isso confesso… passado todos esses anos, o único que sei, é que de mim nada sei.   

Eles também são assim. Às vezes ficam parados como se brincassem de estátua. Observando-se. Nenhum congelado, daqueles que a gente guarda no freezer, seria capaz de parecer tão encantadoramente sólido quanto eles. São duas pedras de gelo, o cachorro e o homem. E ao contrário do que se possa imaginar: são ágeis. Atravessam a sala com a rapidez de um raio. O cachorro, afoito, derruba tudo que vê pela frente, em busca de uma bola. E o dono, que parece mais cachorro do que o próprio cachorro, passa atabalhoado, acreditando correr mais que o cão. Eles são dois espíritos cortados ao meio: metade tufão, metade vulcão. E de ventania em ventania, de lava em lava, viram o mundo de pernas para o ar.

O dono segue o cão pela vida como se ele fosse o guia de um cego. Não faz nada sozinho. O cão é o destino do homem. O homem é a sombra do cão. O homem não sabe; todavia, mais esperto que o dono, o cão já se deu conta que aquele homem é o seu humano. O dono do cão desde sempre soubera que ambos são bicho do mato: indomáveis feito cavalo bravo. Indomesticáveis como cão sem dono. Assim é o bicho-homem. Assim é o bicho-cão. São seres instintivos estes dois. Marionetes da natureza. Mamulengos do acaso. Por isso não sabem direito quem é  o homem e quem é o cão. São bichos atravessando o domingo como quem atravessa o mundo em um balão. Pois domingo é dia bom para cachorro. Dia de comer pipoca, namorar no sofá, fazer amor de conchinha, ir ao cinema à tardinha, passear em Ipanema, mergulhar no mar.

Domingo é dia do homem. Domingo é dia do cão.

 

         CONTACT CARLOS ALBERTO PEREIRA DOS SANTOS:


SUNDAY MORNING™ © copyright by Carlos Alberto Pereira dos Santos 2013
TODOS OS DIREITOS AUTORAIS RESERVADOS BY CARLOS ALBERTO PEREIRA DOS SANTOS

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

GAROTO DE PROGRAMA

ETERNAMENTE ANILZA!

COLOQUE O AMENDOIM NO BURACO DO AMENDOIM