FAVELA FASHION WEEK 2


A minha periferia é o mundo. Mas a minha favela é o Brasil.

(Betto Barquinn)


Todo sábado é dia de mutirão aqui na Favela Brasil. Quem é de construção traz areia, cimento, tijolo, pedra, concreto, vergalhões, argamassa, carrinho de pedreiro, elementos vazados, claraboias, escadarias, betoneira, estribo de aço, gesso, coluna de aço, sapata de aço, tela de aço, arame, cimento branco, cantoneira para reboco, calha de piso em PVC, canos, escadas de madeira, pisos interiores e exteriores, impermeabilizantes, mantas asfálticas, fossas, cisternas, balaustre, tubos e conexões, grelhas, ralos, conjuntos, válvulas e flexíveis, tintas, tampão de ferro, telhas, portas e janelas, revestimentos de parede, caixa d' água, cubas, filtros, gabinetes, torneiras, misturadores, louças, assentos, boxes, duchas e chuveiros, pias, cubas, caixas de correio, porcelanato, pastilha, revestimento interno e externo, acessórios piso e parede, fios, cabos, equipamentos periféricos, climatização e ventilação, equipamentos de distribuição, pisos laminados, caixa de ferramentas, pincéis e rolos, luminárias, colas e fitas adesivas, fechaduras, entre outras coisas. Tem a galera que faz corpo mole e diz que se fizer sol vai dar praia, que se der praia não vai rolar, se rolar só se for no Piscinão de Ramos, se for no Piscinão de Ramos só no sábado que vem, mas no final todo mundo aparece e o mutirão da habitação vira coisa de gente grande. Quem trabalha no sábado dá um jeito de voltar mais cedo para casa, descansar um pouco, arregaçar as mangas, tomar uma gelada e colocar a mão na massa. Aqui as dificuldades são enormes, mas cada um separa o quanto pode e ajuda a construir a casa do outro. A gente tem uma vida muito difícil, sabe? Mas não reclama de nada. E isso conta pontos a nosso favor. Porque a gente sempre arruma uma forma de dar a volta por cima, através da prática do amor ao próximo. A primeira vista, a forma é pobre. Mas com um olhar mais generoso, percebe-se facilmente que o conteúdo é riquíssimo. Alguns de nós utilizam o recurso do Aluguel Social, enquanto aguardam as novas casas que sairão através das obras do Programa de Aceleração do Crescimento. Mas para a maioria de nós, nem um recurso nem outro, passou por aqui. Então para melhorar as condições de moradia da rapaziada, unimos esforços, economizamos até o último centavo dos nossos caraminguás, e assim, pegamos os minúsculos barracos feitos de madeira cobertos de palha, telha ou zinco, e transformamos em casas de alvenaria. É um trabalho de formiguinha, mas nada nessa vida vem de graça. A única solução é trabalhar, trabalhar, trabalhar. E ajudar, ajudar, ajudar. O Cartão Família Carioca da Prefeitura do Rio de Janeiro, que veio beneficiar àqueles que como nós, vivem abaixo da linha da pobreza, é um suporte bastante louvável. O Bolsa Família do Governo Federal, que também beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza, ajuda a botar comida na mesa. Com a chegada da Unidade de Polícia Pacificadora, finalmente a paz passou a fazer parte das nossas vidas. Não aguentávamos mais tanto descaso das autoridades e tanta violência por parte do poder paralelo. Nesses anos todos, aprendemos uma lição'O bem sempre vence o mal. Felicidade não tem nada haver com dinheiro. O verdadeiro amor nunca morre. Quem tem fé consegue o que quer. Quem tem amigo não passa necessidade. E nada é mais valioso nesta vida que uma bela amizade'. Por isso quem pode ajudar e não ajuda, já recebeu a sua recompensa. Não pode esperar mais nada da vida, além de dor e sofrimento, porque da vida cada um só recebe, aquilo que doa. E quem não doa nada de si é um pobre coitado; digno de pena. Infeliz daquele que se acha superior a quem quer que seja. Pois nada é tão distante para nós que estamos debaixo do mesmo céu. Foi por causa desse pensamento que nos unimos e construímos uma creche, um posto de saúde e uma biblioteca. A gente precisa de moradia. Mas também precisa de saúde, esporte, trabalho, saneamento básico, rede de esgoto, lazer, segurança, cultura e educação. Por isso montamos a Biblioteca Popular: Para nos enriquecer! Cada um trouxe um pouco do que tinha, e de grão em grão, a galinha encheu o papo. Quem gosta do Trovadorismo trouxe o João Soares de Paiva. Quem gosta do Humanismo trouxe o Gil Vicente e o Álvaro Velho. Quem gosta do Renascimento trouxe o Luís de Camões. Quem gosta do Barroco trouxe o Gregório de Matos. Quem gosta do Arcadismo trouxe o Alvarenga Peixoto, o Tomás Antonio Gonzaga e o Cláudio Manoel da Costa. Quem gosta do Realismo trouxe o Machado de Assis e o Raul Pompéia. Quem gosta do  Naturalismo trouxe o Aluízio de Azevedo. Quem gosta do Parnasianismo trouxe o Raimundo Correa, o Olavo Bilac e o Alberto de Oliveira. Quem gosta do Simbolismo trouxe o Alphonsus de Guimaraens e o Cruz e Souza. Quem gosta do Pré-modernismo trouxe o Lima Barreto, o Augusto dos Anjos e o Euclides da Cunha. Quem gosta do Modernismo trouxe o Graciliano Ramos, o Carlos Drummond de Andrade, o Jorge Amado, o Oswald de Andrade, o Erico Verissimo e o Mário de Andrade. Quem gosta dos autores contemporâneos trouxe a Clarice Lispector, o Carlos Heitor Cony, o Guimarães Rosa, o Rubem Fonseca, entre tantos. Quem gosta do gênero histórico  trouxe a narrativa por efemérides, anais e décadas. Quem gosta de crônica  trouxe a narrativa cronológica de fatos relativos a um reino, governo ou acontecimento. Quem gosta de memórias  trouxe a narrativa onde o autor expõe fatos ligados a ele, sendo  este o personagem central da história. Quem gosta do comentário trouxe a narrativa de fatos ou acontecimentos históricos, cujo autor tenha sido contemporâneo. Quem gosta de biografia trouxe a narrativa sobre a vida de personagens reais. Quem gosta do quadro histórico  trouxe a narrativa de fatos que marcaram o país. Quem gosta de romance histórico  trouxe a narrativa de fatos, tanto verdadeiros quanto imaginários, expostos pelo autor. Quem gosta de história  trouxe a narração de fatos causados pela natureza ou pelo homem,  que marcaram a caminhada da humanidade. Quem gosta do gênero didático  trouxe a narrativa que tem como objetivo ensinar. Quem gosta do gênero narrativo  trouxe todo tipo de ficções: fábula, conto, romance, parábola, anedota, novela e apólogo. Quem gosta de epístola trouxe cartas reais ou ficcionais,  narrando fatos históricos que unem a ação ao personagem, o personagem ao maravilhoso, o maravilhoso à proposição, a proposição à invocação, a invocação à dedicatória, a dedicatória à narração e a narração ao epílogo. Quem gosta do oratório  trouxe a narrativa para influenciar pessoas. Quem gosta de poesia  trouxe os gêneros: épico, lírico, acalanto, hino, ode, canção, soneto, elegia, acróstico. Quem gosta do pastoril  trouxe a narrativa da vida no campo,  éclogas ou idílio. Quem gosta do gênero satírico trouxe a paródia. Quem gosta do gênero dramático  trouxe a tragédia, a comédia e o drama. Quem gosta de tudo junto e misturado, trouxe o sarau, unindo escritores, músicos, declamadores, contadores de história, atores, cordelistas, bailarinos, artistas circenses, ilustradores, quadrinistas, trovadores, repentistas, pintores e fotógrafos. E quem não trouxe nada, senta, abre um livro e lê. Literatura é libertação. Literatura é um ato de cidadania. Um povo que não lê é muito mais pobre do que imagina. Porque nem imagina quão rico é ou poderia ser: O ato. A ação. A imagem. A imaginação. Tudo que me leva a ser cidadão, vale muito mais que qualquer migalha espalhada ao chão. Ao léu. Na aba do chapéu. Na bolha de sabão. Cons-tru-ção. Ci-da-dão!      


A missão de todo ser humano é amar a Deus sobre todas as coisas, ao próximo como a si mesmo, servir os mais pobres sempre e nunca possuir nada que não possa dividir. Nenhum bem material vale mais que um átimo de segundo da alma. O resto é o resto e só. Ponto e basta. O mutirão continua sábado que vem Amém! Agora vou correndo para casa, que a noite já vai começar. E como na favela quando escurece, os homem viram estrelas, e hoje é uma linda noite para estrelas virar, passá-la-ei inteira ao lado da minha nêga, dizendo: I LOVE YOU.

 Falando nisso, eu já disse que te amo hoje?



 Não?!



 EU TE AMO!



 E você? Já disse “EU TE AMO” hoje?



 Não?!



 Então diga!



Beijo, me liga!










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Comentários

  1. Betto, personalidades como você fazem da vida da gente o maior barato. Amei esse seu “Favela Fashion Week 2!”. Deus te abençoe, amado! Beijos!

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  2. Adorei, gatinho! Bjs!!!

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  3. Lindo de viver! Amei!

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  4. Luiz Ricardo do Amaral Peixoto31 de maio de 2011 às 07:21

    Cara, nunca vi tanto talento junto num só lugar. Seu blog é muito bom, fera. Não tem um texto aqui que seja mais ou menos... Todos são ótimos! E olha que eu fiquei zapiando por aqui e fiquei de cara com o seu talento. Parabéns, fera! Parabéns!

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  5. Cara, você é um gênio! Escreve muuuuuuuuuuuito bem! Me emocionei com teu texto, fera! Parabéns, leke!

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  6. Pedro Paulo Figueiredo1 de junho de 2011 às 07:36

    Gênio! Gênio! Gênio! Gênio! Vida longa ao Rei! Vida longa Betto Barquinn!!!! Abs!

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  7. Ricardo Santos de Albuquerque1 de junho de 2011 às 09:32

    Betto, esse é o melhor blog de literatura brasileira. Aqui você expõe textos próprios, sérios, cheios de poesia. Até aqueles textos que parecem mais engraçados, são tão reais, que viram matéria para gente grande. Amo visitar este blog! Parabéns, meu amigo. Sucesso, meu rei!

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  8. Luiz Felipe Montenegro2 de junho de 2011 às 12:02

    Muito bom o seu blog, Betto! Os textos são todos maravilhosos! Cara, você escreve muito bem! Parabéns!

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  9. Betto, os seus textos não são nada comuns, e é por isso que você tem angariado tantos admiradores. Muitos amigos meus vieram elogiar o seu blog. Aqui estão postados verdadeiras preciosidades. Ainda ontem, aqui na faculdade, conversei com os alunos sobre esse seu texto atual. Todos adoraram. Esta sua iniciativa de falar de favela, não como algo pejorativo, mas com esperança traz uma faceta nova na linguagem literária. O seu blog é um excelente passatempo para aqueles que estão apenas zapiando. E uma excelente fonte de pesquisa para aqueles que verdadeiramente gostam de ler. Textos longos, outros curtos, mas o fundamental é que todos são extremamente bem escritos. Parabéns por ser tão politizado numa época em que as pessoas só pensam em consumir e serem consumidas. Gênios como você merecem ser aplaudidos de pé. Sucesso, meu caro. Sucesso! Vida longa ao Rei!!!

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  10. Maria Carmen Carrasco3 de junho de 2011 às 10:00

    Lindo, lindo, lindo, lindo! Adorei, meu querido! Adorei!

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  11. Adoro os seus textos, Betão! Sucesso, amigo! Sucesso!

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