VOCÊ ABUSOU
Reconciliação
e perdão:
O médico cubano Juan Delgado, hostilizado em Fortaleza por colegas brasileiros no mês de agosto de 2013; que
veio ao nosso país junto com outros noventa e seis médicos estrangeiros (entre
eles, setenta e nove cubanos) para trabalhar no programa ‘Mais Médicos’; que
segundo o Governo Federal (através do Ministério da Saúde) irá suprir a
carência de médicos no Sistema Único de Saúde (SUS), sentiu na pele o que é o
racismo no Brasil. Vaiado, menosprezado, chamado de “escravo” e de
“incompetente” a plenos pulmões, Juan Delgado deve ter pensado: “O que vim
fazer nesse fim de mundo?”. O escárnio público organizado pelo Sindicato dos
Médicos do Ceará (Simec) fez com que a solenidade de acolhimento, organizada
pelo Ministério da Saúde, se transformasse em um show dos horrores.
Até quando viveremos em um país
onde é idolatrada a xenofobia? Até quando o racismo será cultural em nossa
terra? Até quando o preconceito de cor abrirá ou fechará portas? Até quando ser
negro será considerado um crime? Desde quando ser “escravo” ou “descendente de
escravo” é motivo de vergonha? Na infância, — quando li em um livro que “os primeiros imigrantes
não-portugueses que vieram para o Brasil foram os africanos, que eram
utilizados como escravos nas lavouras de café”, — percebi o quão cruel pode ser o povo deste país. Lembro-me de ter lido no mesmo
livro que “graças ao rápido desenvolvimento das plantações de café, no Brasil a
colonização intensificou-se a partir de 1818, quando para cá vieram imigrantes
de fora de Portugal à procura de oportunidades. Vieram, entre outros, alemães,
suíços, japoneses, turcos, árabes, italianos e eslavos. O caso brasileiro é complexo
porque aqui se desenvolveu um processo colonizador cuja característica foi a
mestiçagem cultural. A riqueza cultural e ética do país não é levada em
consideração no quotidiano, tendendo ao esteriótipo e à disseminação de
preconceitos. Em resposta, os conflitos das minorias não se dão apenas com a maioria,
mas muitas vezes entre elas próprias, transformadas umas para as outras em bode
expiatório de sua exclusão social. Discriminação
dá-se através de muitas maneiras. Os nordestinos, por exemplo, são tidos como
ignorantes no sul do país, como “gente” inferior, pouco inteligente, feita para
o trabalho braçal ou outros sem qualificação que exija cultura e quociente
intelectual razoável. O Brasil é um país de raízes mestiças, e que não
constitui historicamente minorias. Deveríamos estar abertos às diferenças que
faz do povo brasileiro um povo tão misto em nossas herança culturais. É nesta
pluralidade e na diversidade dos brasileiros que se pode construir o presente e
perseguir o sonho do futuro possível. Os efeitos dos debates sobre
multiculturalismo no Brasil mereceriam uma discussão à parte, dada a sua
complexidade. O Brasil parece ficar à margem dessas discussões até a década de
1980, data do fortalecimento e visibilidade das chamadas minorias étnicas,
raciais e culturais. A pressão dos novos atores sociais reverbera diretamente
no texto da Constituição de 1988, considerada um marco em termos da admissão do
nosso pluralismo étnico”. Eu não sei de nenhum lugar no mundo onde os
escravos fizeram mal à nação para a qual foram traficados. Sim, traficados. Porque
roubar a liberdade de alguém, jogá-lo em um navio negreiro, fazer com que esse
ser humano atravessasse um continente encarcerado e tratado como lixo, depois
vendê-lo, leiloá-lo, obrigá-lo a trabalhar de forma desumana, acabar com sua
vida, seus sonhos, sua família, seus amores, fazê-lo morrer de tristeza, de melancolia, de banzo; na
miséria… e depois de pouco mais de um século da Abolição da Escravatura, este
ser humano ser tratado como lixo, é nojento.
Acontece no Brasil o mesmo que
acontece na América do Norte, quando se faz piada com os negros, dizendo que
“negros são comedores de melancia”. Na história americana, a melancia era
transportada junto com os africanos que foram contrabandeados para aquele país. Como não havia quase nada para comer durante a viagem, aqueles que um
dia seriam denominados afro-americanos, alimentavam-se da única coisa que havia
no navio negreiro: melancia. Daí a piada de humor negro, literalmente.
A melancia nos Estados Unidos, na época da escravidão, era considerada “comida
de negro”. É o mesmo que se deu por aqui com a feijoada, o samba, a capoeira, a religião e
outras manifestações culturais africanas. E até hoje na América do Norte faz-se
piada com isso. Nojento!
Preconceito, xenofobia, racismo…
Aonde é que nós vamos parar?
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