PIANO MAN



My bed is a bar:

Há um mês mudou-se para o meu prédio uma holandesa muito bonita. Ela é de Amsterdã. Morou um tempo em Portugal, e a par do idioma, veio aprimorar o português no Brasil. Ela contou-me que este era o seu grande sonho: viver em um país tropical. E para tal, escolheu a Cidade Maravilhosa; que segundo ela, é o mesmo que morar em um cartão-postal. Chama-se Beatriz, a minha vizinha gringa. Ela mudou-se para o apartamento ao lado do meu. Todas as manhãs conversamos. Ela malha na academia do condomínio das sete às oito da manhã, e eu, das oito às nove. Quando eu chego, ela está saindo. Mas fica um pouco para que coloquemos a conversa em dia. Ela é muito engraçada. Fala meio enrolado, troca algumas palavras, esquece outras, e vive perguntando: “How can I say this in portuguese?”. Aí eu explico.

Dia desses, por volta das duas horas da manhã, eis que toca a campainha. Vejo pelo olho mágico e era ela. Caindo de sono, mas imbuído do propósito de ser um bom anfitrião (embora ela não esteja hospedada na minha casa), abri a porta e perguntei no que podia ser útil. Ela, um tanto envergonhada devido ao avançado da hora, pediu-me desculpas por importunar-me àquela altura da madrugada, mas acordara com um desejo incontrolável de tomar um drink holandês, e movida por um impulso sobre-humano, não pensou duas vezes: levantou-se e correu para o meu apartamento. Sem entender direito o que ela queria, proferi: “Muito bem. Mas em que posso ajudar?”. Ela respondeu: “Pois não… o drink que desejo tomar, precisa de um ingrediente que não tenho em casa. Chama-se ‘Semence de La Vie’”. Ainda sem entender, indaguei: “E qual é o ingrediente secreto?”. Um tanto ruborizada, ela respondeu: “Não sei se me atrevo a dizer…” Achando aquilo meio confuso, até porque eu estava bastante sonolento, inqueri: “Say what?!”. Ela recuou um pouquinho, encostou a cabeça no batente da porta, e soltou a pérola do ano: “O ingrediente que falta é esperma humano”. Olhei-a alguns segundos, e mais perdido do que cego em tiroteio, balbuciei: “Ah, tá… é isso que você quer?” Ela respondeu-me que sim. Era quase um desejo de mulher grávida: se ela não tomasse o tal drink, o filho que ela não estava esperando, iria nascer com cara e espermatozoide. Preocupado com o destino da “criança”, perguntei: “Como é o drink?” Ela respondeu: “Muito gostoso, refrescante e fácil de fazer. Leva 100 ml de Amarula, 100 ml de Cherry Brandy, 150 ml de gin, 1 colher de chá de sêmen humano (recém colhido), 3 unidades de Yakult de 65ml; acrescenta-se gelo picado, mistura-se os ingredientes em uma coqueteleira, mexe-se bem por cinco minutos, e serve-se em copo longo. Tenho todos os ingredientes em casa. Mas falta o sêmen”. “Entendi” — respondi. “E as pessoas tomam isso na Europa?” — perguntei. “Tomam, sim. É a grande sensação dos clubes de Amsterdã. A bebida eleva o estado mental de quem ingere quase que imediatamente. Este drink é uma excelente opção para quem está de dieta de restrição calórica e deseja entrar no clima da balada sem ter que secar baldes de cerveja ou garrafas de uísque” — respondeu. Depois dessa, sem ter muito o que dizer, fui até o apartamento dela: fizemos amor, paramos um pouco para retardar a ejaculação, ela foi até a cozinha, preparou o drink, levou até o quarto, continuamos namorando, chegamos ao orgasmo, e na hora H, doei o ingrediente que faltava. Achei um tanto esquisito, mas como sou um cavalheiro, realizei o desejo etílico da bela donzela dos Países Baixos.

Agora todo dia é assim. A campainha toca, ela entra, e o drink jorra. Nem vamos mais para o apartamento dela: por conta da nossa profunda intimidade. Estou pensando seriamente em mudar o meu nome para “Mr. Jigger”, se é que você me entende.  

Bebida com esperma? Sei, não. Cada uma que me aparece…

Eu sou o homem-objeto.


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