O PRIMEIRO TABLET A GENTE NUNCA ESQUECE






Em meio ao calor senegalês que invade Barcelona nessa época do ano, saí para pegar meu Tablet na loja. Fico impressionada com essa urgência que a tecnologia imprime na vida da gente. Tudo hoje em dia é para ontem. A cada segundo lançam uma coisa nova. A criatividade desse gente  parece não ter mesmo limites. A impressão que dá é que a gente já nasce com o prazo de validade vencido. E eu que sou uma mulher do século passado, que já vivi guerras pessoais e coletivas, que me casei e acabei de me separar, que estive e deixei de estar, que tive filhos e os criei para o  mundo, que menstruei, e agora vivo na menopausa; o outono da minha existência, fico equilibrando-me entre o start e o pause – abolindo o supérfluo, e fazendo do necessário, o chip nosso de cada dia.



E que calor é esse? Não sei se é a menopausa que está me deixando superaquecida, se preciso de reposição hormonal como diagnosticou meu ginecologista, se é a dieta da costa do mediterrâneo... mas o verão parece tão intenso, que sinto o suor escorrer por lugares que nem sabia que existiam. Quando cheguei na Catalunha em meados dos anos setenta, o nordeste da Espanha não era tão quente assim. A gente caminhava nas ruas e nas praças, e qualquer sorvete caseiro, nos refrescava. Lembro-me que passava às tardes escrevendo no quintal de casa, e agora mau consigo sentar na varanda sem me sentir um assado no forno. A natureza está mesmo descontrolada... Chuvas fora de hora, um mau estar no estado das coisas, uma sensação esquisita de que estamos matando o planeta em doses homeopáticas. Whatever... O ser humano anda demorando em ser tão ruím. Parece que as pessoas não percebem que se não mudarmos os nossos hábitos – a vida na Terra vai ficar cada dia mais insuportável. Além das catástrofes naturais, tem a fome, o medo, a violência, a falta de confiança, a poluição, o desamor, o individualismo, as relações apoiadas nas aparências – feito castelos de areia. É nisso que se transformou a nossa sociedade: Num bando de gente fingindo ser o que não é. Mas deixei-me mudar de assunto... Estou velha demais para ficar deprimida.




Caminhar pelas ruas sinuosas de Barcelona sempre me dá vertigem. Fico sorrindo para todo mundo como se estivesse de pilequinho. Mesmo depois de tantos anos, ainda me sinto uma  turista na cidade. Eu sempre fui assim, meio bobona mesmo... Desde criança tudo para mim é novidade. Fico buscando o lado oculto das coisas, escarafunchando a obviedade do mundo, até encontrar algo que ninguém viu. Mesmo se eu vivesse duzentos anos, jamais perderia essa espontaneidade que me invade a alma. Deve ser por isso que a felicidade nunca me abandonou. Porque sabe que mesmo naqueles dias que demoram em ser tão ruíns, eu irei encontrar algo para me apaixonar. Assim vou vivendo como uma menina que acabou de nascer. Sempre em busca de algo novo para chamar de meu.


Olha eu fugindo do assunto de novo... Meu Deus! Por que me fizeste prolixa e verborrágica, ao invés de simples e objetiva? – “Foco!”, diria meu psicanalista. 'Onde eu estava mesmo?' – eu responderia. Pois bem... Lá vou eu tentar dar algum sentido a essa história... Vem comigo!



Hoje de manhã o telefone tocou e era o rapaz da loja de informática, avisando que o meu dispositivo pessoal em formato de prancheta, havia chegado. E eu fiquei parada ao lado do telefone, não entendendo nada. 'Say what you need to say!' – respondi. Quase tive um enfarte! 'Dispositivo, o quê?!' – perguntei. Fiquei tão assustada que parecia que o rapaz havia dito que alguém havia morrido. Cheguei a pensar até, que era sobre a encomenda que havia feito no sex shop na semana passada, e que meu life-size sex doll, tinha ido parar na casa errada. Fiquei imaginando o vizinho abrindo a caixa do sex shop e dando de cara com o meu mais novo namorado de brinquedo, e se perguntando de quem era aquilo. O boneco tem tantas funções, embora a função principal seja óbvia, que o vizinho iria me olhar torto por décadas. Só faltava o vizinho se apaixonar por mim, querendo ele próprio ser o meu consolo... Imagina se ele soubesse que o  meu “brinquedinho” é tão pós-moderno, que além de vibrar é GPS, fala papai e mamãe e balança o rabo! Olha eu falada na vizinhança, sendo apontada na rua como a mulher do consolo falante! Um prato cheio para os Gossips! Delírios à parte, foram os segundos mais constrangedores da minha vida.  Passado o susto, percebi que esses vendedores adoram falar difícil só para bagunçar a cabeça e a alma da gente. Bastava ele dizer: “Senhora, o seu tablet PC, chegou”. E eu entenderia na hora. Mas não... Ele tinha que usar todo aquele tecnicismo tecnológico só para me  atropelar com as palavras. Muito chato... Acontece que eu com essa mania de comprar tudo pela internet, sempre me atrapalho quando as encomendas chegam.  E essa agora… Eu ainda tinha que me trocar e ir até a loja buscar meu tablet antes de ir para o trabalho. Vida mais ou menos dura essa minha... Sei que todos me conhecem, mas deixe-me falar um pouco de mim... Tenho um programa diário na TVE, que fala sobre cultura, biodiversidade, ecologia, tendência e comportamento, voltado para o público jovem. O programa “¡Barcelona Libre!” já tem cinco anos de vida, é ao vivo, diário, bateu todos os recordes de audiência, passa no horário nobre, agrada tanto à geração X quanto a  geração Y e os Baby Boomers, assistido enfim por mulheres e homens de todas as idades; me colocando na saia justa de ser rica e famosa, numa sociedade cada vez  mais pobre e desqualificada. Então tenho a obrigação de me atualizar diariamente sobre o que está acontecendo na Espanha e no mundo. Por isso compro tantos brinquedinhos de última geração. O tablet PC chegou na minha vida por conta dessa necessidade de me manter atualizada. Após pesquisar no Google, encontrei as seguintes informações: "Além de portátil e fácil de usar, o tablet PC pode ser utilizado para acesso à Internet, organização pessoal, visualização de fotos, vídeos, leitura de livros, jornais e revistas, e para entretenimento com jogos 3D.  Apresenta uma tela touchscreen e tem como o dispositivo de entrada principal a ponta dos dedos ou uma caneta, em vez de um teclado ou mouse. É um novo conceito: não deve ser igualado a um computador completo ou um smartphone, embora possua diversas funcionalidades dos dois. Há também tablets chamados de epads, Itablets, zpad. A maior parte dos Tablet PCs utilizam o Windows XP Tablet PC Edition, ou também o Google Android como sistema operacional, embora tendam a utilizar no futuro o Windows Vista e Windows Seven, dado que algumas versões do novo sistema operativo da Microsoft incorporam já as funcionalidades dedicadas ao Tablet PC, entre elas o Windows Journal e o famoso jogo InkBall. São poucos os que utilizam o sistema operacional Linux. O Tablet PC vem sendo estudado em vários países. Ele já está circulando no mercado espanhol. Nos Estados Unidos já é possível encontrá-los por menos de mil dólares. A popularização deste tipo de computador começa a se dar com o lançamento do iPad, da Apple  – marca responsável pela difusão dos players de MP3 com o iPod. A HP, famosa marca de computadores, notebooks e acessórios, entrou na disputa com o Slate Tablet PC. Apesar de chegar atrasada no mercado, a HP pode se tornar competitiva pois inseriu em seu equipamento, ferramentas que não constam no aparelho da Apple (como câmera para videoconferência, portas USB, entrada para cartão de memória e plugin para visualização de documentos em Flash) e o sistema operacional Windows 7. Também há os Tablets que são mais em conta como o m001, m002, m003, m004, m005, e seus sucessores". Ufa! decorei o manual… Risos!   


Chegando à loja, lá estava meu bebê me esperando. Meu Tablet é lindo! Me ajuda a decorar os textos para o programa, a organizar a minha agenda, a ver as fotos das minhas netas, a navegar, navegar, navegar. Esse Tamagoshi superdesenvolvido me trouxe outra coisa muito importante, que não pode ser medida pela matéria: Autoconhecimento. Fez-me aproximar de sentimentos profundos, daquele bem-estar que só a gente sente, de tudo que não pode ser dito com palavras, porque é de foro íntimo-particular. Aproximei-me de mim, da minha essência, da mulher que me transformei  após todos esses anos – pro meu grande amor.


O primeiro Tablet a gente nunca esquece.   








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Comentários

  1. Oi Betto! Impossível não ficar feliz quando vemos um trabalho com tamanha qualidade. Você é um escritor completo. Consegue dar forma e volume ao texto com um talento tão extraordinário, que a impressão que da, é que o personagem está ali parado a nossa frente. Sempre fico muito emocionada quando leio seus textos, porque você é de fato uma pessoa muito especial. Esse seu talento para falar com generosidade das mulheres é encantador. Poucos homens conseguem isso. Chico Buarque é um deles... e você não deixa nada a desejar. Parabéns, sucesso, muita saúde e muito amor. Você é o tipo de pessoa que merece todas as felicidades do mundo. Tenho orgulho em dizer que sou sua fã! Deus te abençoe!

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  2. Muito lindo! Amei!!! Bjs!

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  3. Genial, Betto! Além de LINDO, TESÃO, BONITO E GOSTOSÃO, você ainda é um ótimo escritor! Parabéns!
    Sua fã apaixonada,
    Cacau Lessa.

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  4. Adorei esse texto Betto! Que blog lindo!!! Inteligente, atual, moderno, chic, contemporâneo. Cara você é tudo de bom! Parabéns!

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  5. Muuuuuuuuuuuuuuito bom!

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  6. Adorei, Betto! Adorei!!!

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  7. Maravilhoso, Barquinn! Parabéns!!!

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  8. Preguicinha, depois eu leio... hehehe

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  9. Amei, Betto. Muito bom!!! Bjs!

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