SORRIA, SORRIA
Un homme et son parapluie:
Ludovico era homem
guarda-chuva. Onde ia lá estava: ele e o ‘objeto portátil, de tamanho variável,
com armação flexível, coberta de tecido impermeável, que protege da chuva ou do
sol quando é aberto; semelhante ao guarda-sol’. “Mas Ludovico, para quê esse
guarda-chuva se não está chovendo?”, —perguntava Amélie. “Ora bolas… se
faz sol é guarda-sol” — respondia Ludovico ao seu grande amor.
Acontece que Ludovico era
conservador. Acreditava que nada iria mudar nem se passasse mil anos. Muito
metódico, gostava de tudo no seu devido lugar. E o pior, não sabia perdoar. Para
ele, perdão era coisa de gente grande: e Ludovico achava-se muito pequeno. “Só os
fortes perdoam”, — dizia. E eu, que sou um reles vezeiro, o máximo que posso fazer é tentar esquecer”.
Ludovico era coisa séria. Tão neurastênico que da paz só conhecia o nome. Era um
homem franzino: daquele que precisa crescer. Crescer em bom sentimento, crescer
em aprofundamento, crescer em autoconhecimento, crescer de dentro para fora.
Um dia Ludovico percebeu que é
impossível fugir de si mesmo. Com ou sem guarda-chuva, com ou sem sofrimento, com ou sem tergiversação; uma hora o homem chega à frente do espelho de si mesmo, e se não
reconhece o que vê, é um caso perdido. Há momentos na vida que é preciso tirar
a máscara. Há momentos na vida que é melhor nem colocá-la. Há momentos na vida
que evadir não vale a pena. Há momentos na vida que o melhor é ficar parado;
avaliando-se. E Ludovico, que era um homem analisado, que sabia que divã é muito mais que uma espécie de sofá sem encosto e sem braços, que de tantos encontros e desencontros tornara-se uma casa vazia, que de lágrima
em lágrima fora capaz de formar um oceano, que era econômico em sorrisos; mas
que aprendeu a rir de si mesmo, aos poucos foi se encontrando. Hoje Ludovico
é capaz de dizer “eu te amo”. E todos sabemos que quem está apto a amar não é
causa perdida. Por isso, ao ver que viver não é nenhum bicho de sete cabeças,
Ludovico deixou o guarda-chuva de lado, saiu pelo mundo disposto a tomar sol
e chuva, e com isso parou de sofrer. Ludovico agora é um homem iluminado.
Hoje Amélie acordou com uma certeza: o ser humano não evolui. Reconstrói-se.
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